É realmente, um pedaço que por razões que a razão desconhece, foi brutalmente arrancado da vida do melancólico, e vem a “síndrome do coração partido”, o “eu prefiro morrer do que viver sem ele/ela” e a terrível sensação de não ter sido “suficiente” para que o objeto de amor não tenha partido.

Esta é a diferença entre luto e melancolia. No luto, o objeto de amor/afeto, realmente não está ou não poderia estar presente, e com o isso, o investimento de energia vai aos poucos se desfazendo, passo a passo, fase a fase, a pulsão de vida vai se reestabelecendo e o falecido deixa de fazer parte do mundo “real”, visto que, segundo nosso Camões, “repousa lá no céu” e repousa eternamente, ou seja, segundo as crenças religiosas de cada um, só depois de partir dessa terra de dor e sofrimento, ou numa próxima encarnação, o enlutado pode se reencontrar com o ente que se foi, levado nos braços da morte.

A tristeza no conceito de melancolia:

Essa triste certeza de que o ser amado, no qual foi investido tanta emoção, partiu e não volta, na questão do luto, faz com que, de certa maneira, não haja mais esperança, e aqui, reside o inferno do melancólico, a certeza de que o objeto de amor e desejo, a razão do “afeto”, a força motriz da “razão de viver”, se foi, por livre arbítrio, e portanto, enquanto há vida há esperança, e assim o melancólico se põe a esperar, e enquanto isso sofre como se lhe faltasse um pedaço.

Alguns sublimam, escrevem versos, produzem obras de arte, outros racionalizam, buscam entender os motivos da perda do objeto, mas, aí encontramos a diferença entre o estado psicótico e a psicose em si. No estado psicótico, e estamos falando dos melancólicos, portanto vamos nos manter dentro dessa categorização.

Diante de tudo que nos foi ensinado, no nosso processo de socialização, via sociedade e mídia, sofrer por amor é aceitável, são dezenas de milhares de obras de ficção enaltecendo a dor do amor, a saudade, e a “melancolia”.

O estado psicótico:

O estado psicótico portanto, fica ali, no limite entre neurose e psicose, o que se conhece como personalidade Borderline, ego ainda mantem contato com a realidade e portanto é capaz de utilizar algumas de suas defesas na “luta” contra sua destruição e ruptura perante a psicose melancólica.

Na melancolia psicótica não acontece o mesmo. O psicótico vai se defender do ego, pois não pode aceitar a realidade.

“A melancolia é, em si, o que Freud chamou (mas que logo perdeu-se como conceito) de neurose narcísica, denotando uma dificuldade ou impossibilidade de transferência libidinal (isto é, a libido volta-se em favor do próprio sujeito narcisista, não se eternaliza).”

A baixa autoestima e o conceito de melancolia:

Ora, sendo a melancolia uma psicose que se origina do narcisismo, numa situação em que o ego não se considera capaz de atingir o ego ideal, sintoma de baixa autoestima portanto, e o melancólico vê, mais de uma vez certamente, o objeto de sua estima, que fazia parte do seu próprio ser, o repudiar, como na primeira infância em algum momento, de forma real ou imaginária, foi repudiado pela mãe, a qual ainda sentia como parte de si, toda a dor do primeiro abandono retorna.

Me pergunto, seria a psicose da melancolia responsável pelo sujeito melancólico buscar objetos de afeto que não apenas o complementem na sua busca por um ego ideal, mas também por objetos de amor que certamente o abandonarão para que a mais uma vez ele esteja “certo” ao afirmar que nunca será suficientemente “bom” ? O melancólico sabotaria suas relações por medo da “certeza do abandono”?

Podemos Concluir Que:

O fato é, melancolia, também chamada de psicose maníaco-depressiva, não é luto e não é “depressão”, não creio que se enquadre apenas numa questão da perda do objeto de amor ou numa deficiência de produção da química cerebral.

É uma psicopatologia que infelizmente acaba sendo idealizada pela questão artística e midiática, e deve ser observada com atenção, pois diante dessa dor e sofrimento, a perda da pulsão de vida é tal, que muitas vezes medidas extremas podem ser a única saída para o psicótico.