No ensejo de preparar esse estudo sobre a Teologia Paulina de Missões, optei- me em apresentá-lo conforme se verá a seguir, por entender que uma leitura daquilo que o apóstolo aos gentios acreditava, produzira e vivenciava, é de extrema importância para a Igreja da atualidade, tão descaracterizada em sua teologia e práticas ministeriais, seguindo ensinamentos não fundamentados nas Sagradas Escrituras mas oriundos da mente de homens, muitos deles com objetivos não compatíveis com a santidade do Evangelho.
Diante do exposto, pretendemos com a graça divina, fazer ver aos leitores como Paulo encarava a questão missionária e a ênfase que se descobre numa leitura de seus escritos. Isto posto, trataremos primeiramente sobre a Escritura que o apóstolo lia, acreditava e pregava. Essa Escritura, que era a escritura dos hebreus, a primeira parte de nossa Bíblia – o Antigo Testamento, era a parte inicial da revelação divina, tida por Paulo como escritura verídica, autoritária e canônica.
Em seguida, examinaremos o assunto das Escrituras produzidas por Paulo, ou seja, o grupo de treze cartas, escritas pelo apóstolo, sob inspiração divina, que faz parte do cânon do Novo Testamento, que legisla sobre quase todos os assuntos ligados à igreja do Senhor, inclusive sobre a obra missionária. Na terceira divisão do trabalho, enfatizaremos a mensagem pregada por Paulo no cotidiano do seu ministério, a mensagem do Evangelho, que tem como pilares a morte e a ressurreição de nosso Senhor Jesus Cristo, mensagem essa que para aquele apóstolo era o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê.
No quarto momento deste trabalho, trataremos da questão do crescimento harmonioso e sadio das comunidades evangélicas fundadas por Paulo ou por outros, mostrando a sua preocupação para com a Igreja do Senhor que ele, como apóstolo, entendia que era responsabilidade sua. Por fim, trataremos da questão social segundo a ótica paulina, através da qual faremos referência a temas como a família, a escravidão, as relações de trabalho, a obediência às autoridades constituídas, os tributos e a ação social da igreja na área da beneficência.
Neste estudo, faremos menção constante das Escrituras principalmente das cartas escritas por Paulo e do livro de Atos dos Apóstolos, no qual encontramos alguns sermões daquele que foi o apóstolo dos gentios.
Objetivamos com isto mostrar a atualidade de Paulo bem como a necessidade de uma releitura de suas cartas, para promover uma mudança na postura ministerial de muitos obreiros do Senhor bem como das comunidades que têm o privilégio de dirigir.
Evidentemente que este trabalho tem as suas limitações, pois não foi nossa pretensão fazer um minucioso estudo sobre a teologia paulina, o que caberia na atualidade, mas apenas enfocar alguns temas que achamos importantes para a Igreja do século XXI que tem uma forte preocupação missionária.
Um aprofundamento da questão paulina deve ser buscado nos abundantes livros já produzidos, principalmente, naqueles ligados à teologia do Novo Testamento ou mesmo à teologia paulina, estando alguns desses livros listados na bibliografia identificada no final deste texto.
I – As Escrituras que Paulo lia
Quando o apóstolo Paulo surgiu no cenário cristão, as escrituras hebraicas, a primeira parte da revelação divina do Cânon Sagrado, já era uma realidade histórica de mais de quatrocentos anos.
As escrituras hebraicas compostas dos livros da lei (Torá), dos Escritos e dos Profetas na classificação do judaísmo, que fora compilada pelo sacerdote-escriba Esdras, no período de 464 – 424 a.C. eram a única escritura aceita pelos judeus como canônica na época de Paulo, bem como até ao dia de hoje.
Devido à cultura grega ter dominado o mundo antigo, surgiu à necessidade de essa Escritura ser traduzido das línguas originais (hebraico e aramaico) para o grego, o que foi feito entre os anos de 284 – 247 a.C. em Alexandria no Egito, por setenta anciãos de Israel, segundo a tradição judaica. Essa versão conhecida pelo nome de Septuaginta, era a escritura usada livremente pelo povo da época ao contrário do texto em hebraico/aramaico, que tinha o seu uso circunscrito aos serviços religiosos da Sinagoga e do Santuário.
A Septuaginta distribuiu os livros por assunto, arrumando-os diferentemente da compilação feita por Esdras (A Lei, os Profetas e os Escritos), em livros da Lei, livros Históricos, livros Poéticos e livros Proféticos, mas mantendo-se fiel aos escritos originais.
Paulo, como judeu-romano que era, poliglota, conhecia as Escrituras Hebraicas bem como a sua tradução para o grego, a Septuaginta. Na escola onde Paulo estudou a de Gamaliel, neto do famoso rabino Hillel, fundador da escola liberal de interpretação das Escrituras, aprendeu os Escritos Sagrados, segundo o seu próprio testemunho: “Eu sou judeu, nasci em Tarso da Cilícia, mas criei-me aos pés de Gamaliel, segundo a exatidão da lei de nossos antepassados, sendo zeloso para com Deus, assim como todos vós sois no dia de hoje” At 22.3. Certamente as duas versões das Escrituras eram trabalhadas em sala de aula, na escola de Gamaliel.
De maneira que, podemos concluir que Paulo conhecia as Escrituras hebraicas e a sua versão grega e as considerava como a revelação divina, autoritativa, verídica e que continha todo o plano de Deus revelado até então.
Paulo entendia que as Escrituras proféticas tinham o seu cumprimento na pessoa e obra de Jesus Cristo nosso Senhor, e na sua argumentação para convencer tanto os judeus apegados ao texto hebraico como aos judeus helenizados, ele fazia uso da mesma de forma abundante.
A mensagem de Paulo tinha uma base escriturística muito forte, isto é o que entendemos da leitura de textos como os a seguir identificados: “Saulo, porém, mais e mais se fortalecia e confundia os judeus que moravam em Damasco, demonstrando que Jesus é o Cristo” At 9.22. “Mas, alcançando socorro de Deus, permaneço até ao dia de hoje, dando testemunho, tanto a pequenos como a grandes, nada dizendo, senão o que os profetas e Moisés disseram haver de acontecer, isto é, que o Cristo devia padecer e, sendo o primeiro da ressurreição dos mortos, anunciaria a luz ao povo e aos gentios” At 26.22,23. “Havendo-lhe eles marcado um dia, vieram em grande número ao encontro de Paulo na sua residência. Então, desde a manhã até à tarde, lhes fez uma exposição em testemunho do reino de Deus, procurando persuadi-los a respeito de Jesus, tanto pela lei de Moisés como pelos profetas” At 28.23.
No poderoso sermão pregado na sinagoga de Antioquia da Pisídia, registrado em Atos 13.16-41, Paulo usou abundantemente as Sagradas Escrituras para provar que o Senhor Jesus Cristo era o Salvador e que todos os que cressem nele seriam justificados diante de Deus.
Em Tessalônica, Paulo ao pregar o Evangelho fê-lo argumentando em cima das Escrituras: “Paulo, segundo o seu costume, foi procurá-los, e por três sábados, arrazoou com eles acerca das Escrituras, expondo e demonstrando ter sido necessário que o Cristo padecesse e ressurgisse dentre os mortos; e este, dizia ele, é o Cristo, Jesus, que eu vos anuncio”. At 17.2,3.
Em Beréia, a argumentação escriturística fora atentamente acompanhada pelos bereanos, resultando na conversão de muitos deles. No sermão, no areópago em Atenas, registrado em At 17.22-31, perante uma seleta plateia gentia, Paulo usa as Escrituras para testificar àqueles homens a graça divina, inclusive fazendo uma incursão na própria cultura grega, citando um de seus poetas. Em Corinto, na sinagoga que existia naquela cidade, Paulo testemunha aos judeus, baseado nas Escrituras, que Jesus era o Cristo, o Messias esperado (At 18.1-5). Em Éfeso (At 19.8), o apóstolo Paulo prega na sinagoga e o livro texto de seu sermão era as Sagradas Escrituras que chamamos de Antigo Testamento.
Também em seu testemunho pessoal sobre a conversão a Cristo Jesus, Paulo faz alusão ao antigo texto sagrado (At 26.1-27).
Diante do exposto, concluímos este assunto, realçando que Paulo era um profundo conhecedor das Escrituras hebraicas, e que a interpretava corretamente, e que fazia a sua aplicação de forma contextualizada em suas pregações e ensino ao longo de seu ministério apostólico.
Essa postura de Paulo acerca da valoração das Escrituras do Antigo Testamento nos faz refletir sobre a importância dessa parte do Cânon Sagrado bem como do teor das mensagens pregadas hoje nos púlpitos das igrejas evangélicas e nos campos missionários, muitas delas fugindo da real veracidade do texto bíblico, bem como de sua aplicação correta.
II – As Escrituras produzidas por Paulo
Deus, segundo o beneplácito de Sua soberana vontade, escolheu o apóstolo Paulo para ser um dos instrumentos de Sua revelação especial. Paulo, pela graça de Deus, além de ter sido um eficaz pregador foi também um exímio escritor. Ele produziu sob inspiração divina, treze dos vinte e sete livros do Novo Testamento. Dentre as suas cartas, nove foram destinadas a Igrejas organizadas, e quatro a obreiros e colaboradores seus.
Paulo em suas epístolas tratou, praticamente, de todos os grandes assuntos da fé cristã, e esses ensinamentos consolidaram o corpo doutrinário como nós o conhecemos hoje.
A seguir veremos sucintamente o conteúdo de cada escrito do apóstolo aos gentios:
Carta aos Romanos – A mais formal das cartas escritas por Paulo. A epístola aos Romanos apresenta, de maneira sistemática, a doutrina da justificação pela fé e suas ramificações. O tema da epístola é a justiça de Deus (1.16,17). Um bom número de doutrinas fundamentais da fé cristã é discutido: a revelação natural (1.19,20), a universalidade do pecado (3.9-20), a justificação pela fé (3.24), a propiciação através do sangue de Jesus (3.25), a fé (cap. 4), o pecado original (5.12), a união com Cristo (cap. 6), a vida no Espírito (cap. 8), a eleição e rejeição de Israel (cap. 9-11), os dons espirituais (12.3-8) e o respeito às autoridades (13.1-7).
Carta aos Coríntios (Primeira) – Essa carta é predominantemente prática em sua ênfase, tratando de problemas espirituais e morais de uma igreja local. É um manual prático de teologia pastoral. Ênfases importantes incluem: a preservação da unidade da igreja (1.10-13), Cristo, o centro da mensagem de Paulo (1.23,24), Cristo, o fundamento da igreja (3.10-15), o tribunal de Cristo (3.11-15), a habitação do Espírito (6.19,20), a glória de Deus (10.31), a ceia do Senhor (11.23-34), o exercício dos dons espirituais (cap. 12-14), o amor (cap. 13), e a ressurreição do corpo (cap. 15).
Carta aos Coríntios (Segunda) – Contém detalhes pessoais e autobiográficos da vida de Paulo (4.8-18; 11.22-33). O tratamento mais importante da contribuição cristã, no Novo Testamento, é encontrado nos capítulos 8 e 9.
Carta aos Gálatas – O tema justificação pela fé é defendido, explicado e aplicado. Outros assuntos significativos são a estada de Paulo na Arábia por três anos (1.17), sua repreensão a Pedro (2.11), a lei como aio ou pedagogo (3.24) e o fruto do Espírito (5.22,23).
Carta aos Efésios – O grande tema dessa carta é o propósito eterno de Deus de estabelecer e completar o Seu povo, a Igreja de Cristo. Ao desenvolver este tema, Paulo trata da predestinação (1.3-14), a liderança de Cristo sobre o corpo, como cabeça (1.22,23; 4.15,16), a Igreja como edifício e templo de Deus (2.21,22), o mistério de Cristo (3.1-21), dons espirituais (4.7-16), o viver do cristão (4.17-32), e a Igreja como noiva de Cristo (5.24-32), e a armadura espiritual do cristão (6.10-18).
Carta aos Filipenses – Uma das mais importantes passagens doutrinárias do Novo Testamento é Filipenses 2.5-8; nela Paulo apresenta a doutrina da kenosis – a auto-humilhação ou auto-esvaziamento de Cristo. É enfatizada a oração (4.6,7). Um retrato autobiográfico significativo aparece em 3.4-14.
Carta aos Colossenses – O tema é a supremacia e plena suficiência de Cristo. Assuntos importantes incluem a pessoa e obra de Cristo (1.15-23), heresia gnóstica (2.8-23) e a união do cristão com Cristo (3.1-4).
Carta aos Tessalonicenses (Primeira) – As passagens chaves dessa epístola são escatológicas, ou seja, relacionadas aos acontecimentos dos últimos dias, como a segunda vinda de Cristo, o arrebatamento da Igreja (4.13-18) e o dia do Senhor (5.1-11).
Carta aos Tessalonicenses (Segunda) – A divisão principal trata sobre o homem do pecado (2.1-12) deve ser comparada com outras passagens na Bíblia que falam desse anticristo (Dn 9.27; Mt 24.15; Ap 11.7; 13.1-10).
Carta a Timóteo (Primeira) – Em relação a Timóteo pessoalmente, o tema da carta é “combater o bom combate” (1.18). Em relação à Igreja como um corpo, o tema é “a conduta na casa de Deus” (3.15). Assuntos importantes na epístola incluem a lei (1.7-11), oração (2.1-8), traje e atividades das mulheres (2.9-15), qualificações para bispos ou presbíteros e diáconos (3.1-13), os últimos dias (4.1-3), o cuidado para com as viúvas (5.3-16), e o uso do dinheiro (6.6-19).
Carta a Timóteo (Segunda) – O tema pode ser derivado de 2.3, “um bom soldado de Cristo Jesus”. Assuntos importantes na carta incluem a apostasia dos últimos dias (3.1-9; cf. 1 Tm 4.1-3), a inspiração das Escrituras (3.16), e a recompensa do cristão fiel (4.8).
Carta a Tito – Tópicos importantes discutidos nesta carta incluem as qualificações para o presbiterato (1.5-9), instruções a várias faixas etárias na Igreja (2.1-8), relação entre a regeneração, as obras humanas e o Espírito (3.5).
Carta a Filemom – É a mais pessoal das cartas de Paulo. O apóstolo Paulo intercede por um escravo que se tornara cristão através de sua instrumentalidade.
Em algumas dessas cartas, observa-se o grande interesse de Paulo em consolidar e estruturar as Igrejas conforme os textos encontrados em 2 Co 11.2,3; 1 Co 4.17; Gl 4.19,20;…
Paulo com os seus escritos deu uma contribuição extraordinária à obra missionária, considerando que fazer missões é muito mais do que pregar o Evangelho, mas também edificar igrejas autóctones, sadias, equilibradas. Os ensinos de Paulo em suas cartas têm a finalidade de atender essa necessidade, ou seja, fornecer um padrão estabelecido por Deus para a obra missionária, padrão esse que é o paradigma nessa área em todas as épocas.
III – A mensagem do Evangelho pregada por Paulo
A mensagem pregada por Paulo, em seus sermões e escritos, tinha como pontos centrais a morte e a ressurreição do Senhor Jesus Cristo, conforme os textos a seguir identificados: “e, embora não achassem nenhuma causa de morte, pediram a Pilatos que ele fosse morto. Depois de cumprirem tudo o que a respeito dele estava escrito, tirando-o do madeiro, puseram-no em um túmulo. Mas Deus o ressuscitou dentre os mortos” (At 13.28-30). “expondo e demonstrando ter sido necessário que o Cristo padecesse e ressurgisse dentre os mortos, e que este é o Cristo, Jesus, que eu vos anuncio” At 17.3. “Porquanto estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça por meio de um varão que destinou e acreditou diante de todos, ressuscitando-o dentre os mortos” At 17.31.
Na apresentação da essência do Evangelho, quando escrevia aos Romanos e aos Coríntios, Paulo disse: “O qual por nossos pecados foi entregue, e ressuscitou para nossa justificação”. Rm 4.25. “Também vos notifico, irmãos, o evangelho que já vos tenho anunciado; o qual também recebestes, e no qual também permaneceis pelo qual também sois salvos se o retiverdes tal como vo-lo tenho anunciado; se não é que crestes em vão. Porque primeiro vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras, e que foi sepultado, e que ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras”. 1 Co 15.1-4.
O Evangelho de Cristo que significa boas novas de salvação através de Jesus Cristo, que segundo Paulo é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê (Rm 1.16,17), é a mensagem redentora proporcionada pela morte de Jesus Cristo que, de acordo com o apóstolo, tinha as seguintes características teológicas:
1) Uma morte expiatória – A expiação é a anulação da culpa ou a remoção do pecado por meio de alguma interposição meritória. “Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se maldição em nosso lugar, porque está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro”. Paulo vê a morte do Senhor Jesus Cristo como uma morte expiatória. Em várias referências, ele associa distintamente a morte de Cristo com o ritual e conceito de sacrifício do Antigo Testamento.
Em Romanos 3.25, Paulo faz uma alusão direta à oferenda pelo pecado que era apresentada pelo sumo sacerdote no ritual judaico do grande Dia da Expiação. Ele descreve a morte de Cristo como oferta e sacrifício a Deus, em cheiro suave (Ef 5.2). O aspecto expiatório da morte de Cristo é visto nas frequentes referências ao Seu sangue, conforme os textos de Rm 3.25; 5.9; Ef 1.7; 2.13 e Cl 1.20.
2) Um sacrifício pelos pecados – a morte de Cristo foi um sacrifício eficaz a favor do pecado do homem. Por conseguinte, cada membro da raça humana nasce em tese sobre a sombra protetora da cruz. Assim como a culpa do pecado de Adão é imputada a sua posteridade, assim também a sua posteridade compartilha da ação meritória da obra redentora realizada por Cristo na cruz do Calvário. A morte de Jesus Cristo é, potencial e provisionalmente, um sacrifício em favor dos pecados do mundo. Nesse sentido, Ele provou a morte em favor de todo homem e a si mesmo se deu em resgate por todos, e é o Salvador dos homens. “Lançai fora o velho fermento, para que sejais nova massa, como sois de fato sem fermento. Pois também Cristo, nosso Cordeiro Pascoal, foi imolado” 1 Co
5.7. Evidentemente que deve ser considerado todos os homens, nesse contexto, como todos aqueles que foram eleitos por Deus para a salvação na eternidade.
3) Uma morte vicária – A morte de Cristo não foi acidental, nem foi um martírio, nem foi motivada porque a merecesse, mas foi uma morte em favor de outros, e não foi por sua própria causa que ele morreu. “Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras” 1 Co 15.3. A ideia aqui apresentada é de que o sacrifício de Cristo foi um sacrifício vicário, isto é, em favor de outros. Cristo não morreu pelos seus próprios pecados porque não os tinha. A sua morte não foi um acidente, nem foi a morte de um mártir, mas sim uma morte em favor dos outros. Essa é a ideia transmitida por Paulo apreendida da leitura dos textos encontrados em 1 Ts 5.10; Rm 5.8; 8.32; Ef 5.2 e Gl 3.13.
4) Uma morte redentora – O termo resgate pressupõe o livramento por meio de um substituto, de um cativo ou devedor incapacitado de efetuar seu próprio livramento. Segue-se, naturalmente, que a emancipação e a restauração resultam do pagamento do resgate. Cristo remiu-nos da maldição imposta por uma lei desobedecida, ao fazer-se maldição em nosso lugar. Sua morte foi o preço do resgate que foi pago. “Vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para resgatar os que estavam sob a lei, a fim de recebermos a adoção de filhos” Gl 4.4,5.
O homem, segundo Paulo, está sob o controle do pecado, sendo seu escravo. A morte redentora de Cristo o libertou da escravidão do pecado, do império das trevas e o transportou para o reino do Filho do seu amor (Cl 1.13). A ideia geral é que essa redenção foi possível graças ao preço pago por ela, a morte de Jesus. Os textos de Paulo que consolidam o assunto são Tt 2.14; 1 Tm 2.6; Rm 3.24,25; Ef 1.7; l Co 6.19,20; 1 Co 7.22,23; Gl 3.13; 4.4;5.
5) Uma morte propiciatória – O caráter propiciatório da morte de Jesus é adiante apoiado pelo texto de Rm 3.25,26. A morte de Cristo foi um ato de justiça, uma demonstração de que Deus era de fato um Deus justo e que puniria o pecado do homem. A ira de Deus contra o pecador fora aplacada pela morte de Seu filho. Uma propiciação foi concedida, para livrar os seres humanos da ira de Deus, que é revelada nos céus contra toda sorte de impiedade e injustiça dos homens (Rm 1.18).
6) Uma morte substitutiva – O nosso Senhor sendo inocente (2 Co 5.21) não tinha porque morrer como morreu. Sua morte não foi o resultado de seu próprio pecado ou culpa; ela foi sofrida no lugar de outros, que eram culpados e mereciam morrer. Por causa de sua morte não merecida, os pecadores são libertados da condenação à morte e da experiência da ira de Deus que eles grandemente mereciam. Os textos de Paulo sobre o assunto se encontram em Gl 2.20; 1 Tm 2.6; 2 Co 5.15; Gl 3.13.
O segundo ponto sobre o qual a mensagem do Evangelho está fundamentada, segundo a ótica paulina, é a ressurreição de Cristo. No entendimento de Paulo, a ressurreição de Cristo autenticou a eficácia da obra redentora realizada na cruz do Calvário. A ressurreição de Cristo está tão intimamente ligada a Sua morte que os apóstolos dentre eles, Paulo, entendiam que a primeira (a morte de Cristo) implicaria necessariamente na segunda (a ressurreição de Cristo) e que a segunda seria consequência natural da primeira. Eles diziam que era impossível que Jesus fosse retido pela morte (At 2.24) ou que era necessário que assim acontecesse, pois, estava escrito que o Cristo deveria morrer e que ressuscitaria no terceiro dia (At 2.25-31).
O apóstolo Paulo que ministrou sob a direção e inspiração do mesmo Espírito que operara nos outros apóstolos, estava alinhado com a ideia da importância crucial da ressurreição de Jesus no programa redentor de Deus. Nas suas pregações, Paulo fazia referência à ressurreição do Senhor tanto quanto à Sua morte ignominiosa. “Depois de cumprir tudo o que a respeito dele estava escrito, tirando-o do madeiro, puseram-no em um túmulo. Mas Deus o ressuscitou dentre os mortos” At 13.29,30. “Paulo, segundo o seu costume, foi procurá-los e, por três sábados, arrazoou com eles acerca das Escrituras, expondo e demonstrando ter sido necessário que o Cristo padecesse e ressurgisse dentre os mortos” At 17.2,3. “Porquanto estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça, por meio de um varão que destinou e acreditou diante de todos, ressuscitando-o dentre os mortos” At 17.31.
Segundo Paulo, esse ponto era de fundamental importância para a redenção do pecador. Na sua argumentação acerca da ressurreição do salvo, no capítulo 15 de sua primeira carta aos Coríntios, embasando o assunto, fazendo referência à ressurreição de Cristo ele nos revelou a importância dela na mensagem do Evangelho, conforme registros encontrados a seguir:
a) Quanto à confiabilidade da pregação o Evangelho – “E, se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação…” 1 Co 15.14;
b) Quanto à validade da fé salvadora – “E, se Cristo não ressuscitou… também é vã a vossa fé” 1 Co 15.14.
c) Quanto ao perdão dos pecados – “E, se Cristo não ressuscitou… ainda permaneceis nos vossos pecados” 1 Co 15.17
c) Quanto à salvação eterna da pessoa – “E, se Cristo não ressuscitou… os que dormiram em Cristo estão perdidos” 1 Co 15.18.
d) Quanto à ressurreição do salvo – “Mas, agora, Cristo ressuscitou dos mortos e foi feito as primícias dos que dormem” 1 Co 15.20. “Mas cada um por sua ordem: Cristo, as primícias; depois os que são de Cristo na sua vinda” 1 Co 15.23.
Concluímos este assunto, enfatizando que a mensagem pregada por Paulo e pelos seus colegas apóstolos era a pura mensagem do Evangelho de Cristo, que de forma autoritativa dizia que as boas novas para redenção do homem fora possível graças à morte e à ressurreição do Senhor. “Irmãos, venho lembrar-vos o evangelho que vos anunciei; o qual recebestes e no qual ainda perseverais; por ele também sois salvos, se retiverdes a palavra tal como vo-la preguei, a menos que tenhais crido em vão. Antes de tudo, vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, e que foi sepultado, ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras” 1 Co 15.1-4.
Contextualizando o assunto, entendemos que a Igreja da atualidade deve se espelhar em Paulo e voltar a pregar a verdadeira mensagem do Evangelho, fazendo ver a todos que Cristo morreu pelos pecados e ressuscitou para a justificação do homem, conforme o apóstolo escreveu em Romanos 4.25.
IV – O ensino Paulino visando o crescimento harmonioso da Obra Missionária
No entendimento de Paulo, a obra missionária não se restringia apenas à pregação do Evangelho, mas também arregimentar os salvos, organizando-os em ekklesia e estruturando-os para que pudessem se edificar mutuamente, visando um crescimento espiritual sadio.
Paulo não entendia a obra missionária apenas como campanhas evangelísticas itinerantes, mas como um profundo trabalho local, autóctone. Na sua vida como ministro do Evangelho se percebia isso de forma clara. No livro de Atos dos Apóstolos (14.23), na sua primeira viagem missionária, encontramo-lo promovendo a eleição de liderança para que o trabalho tivesse a sua forma adequada conforme o propósito de Deus. “E, promovendo-lhes, em cada igreja, a eleição de presbíteros, depois de orar com jejuns, os encomendaram ao Senhor em que haviam crido”. Essa era a sua prática: Pregava o Evangelho, as pessoas eram convertidas e, à medida que o grupo crescia, Paulo tratava logo de organizar uma igreja, instituindo sua liderança – os Presbíteros, que haveriam de tomar conta do trabalho dali por diante.
Em suas instruções a Timóteo e a Tito, dois ministros do Evangelho, seus colegas, Paulo trata da questão. Na carta a Timóteo ele traça o perfil da liderança presbiterial bem como da liderança diaconal, que haveriam de gerir os negócios da Igreja cada um na sua área específica de atuação (1 Tm 3.1-13). Na carta a Tito, Paulo orienta aquele ministro a, democraticamente, escolher com os membros da Igreja os Presbíteros, traçando também o perfil dos mesmos (Tt 1.5-9).
Esse posicionamento de Paulo, dirigido pelo Espírito Santo, consolidava a obra missionária, porque a tendência natural da igreja organizada era crescer e avançar na pregação do Evangelho. “Porque de vós repercutiu a palavra do Senhor não só na Macedônia e Acaia, mas também por toda a parte se divulgou a vossa fé para com Deus, a tal ponto de não termos necessidade de acrescentar coisa alguma” 1 Ts 1.8. “Desde que ouvimos da vossa fé em Cristo Jesus e do amor que tendes para com todos os santos; por causa da esperança que vos está preservada nos céus, da qual antes ouvistes pela palavra da verdade do evangelho, que chegou até vós: como também, em todo o mundo, está produzindo fruto e crescendo, tal qual acontece entre vós,…” Cl 1.4-6.
Sabia Paulo que, uma coisa era uma pessoa sozinha pregar o Evangelho, ou mesmo fazer isso acompanhado de outra pessoa, mas outra coisa era o esforço feito na pregação do Evangelho por uma igreja organizada, contando com a colaboração de seus membros e congregados, todos imbuídos de um só propósito de fazer o Reino de Deus avançar neste mundo. Paulo tinha conhecimento de que esse esforço organizado pela comunidade eclesial produzia o crescimento numérico da mesma para a glória de Deus.
Além disso, preocupava-se o apóstolo do Senhor com o crescimento espiritual (qualitativo), através dos dons espirituais distribuídos por Deus a Igreja, conforme os registros encontrados em suas cartas destinadas aos Romanos (Rm 12.6-8), aos Coríntios (1 Co 12.4-11) e aos Efésios (Ef 4.10-16).
Na compreensão de Paulo, os dons espirituais de diversas naturezas, principalmente os dons de liderança, foram dados a Igreja visando o crescimento harmonioso do corpo de Cristo. “E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos, para o desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo, até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo”. Ef 4.11-13.
Hoje, temos a tendência de exaltar o ministério pastoral como completo em si mesmo e capaz de atender a todas as demandas da Igreja. Paulo não pensava assim. No seu entendimento, os dons eram diversos, inclusive os de liderança, e dados a pessoas diferentes, com a finalidade como já dissemos, de promover o crescimento espiritual da Igreja do Senhor. “Os dons são diversos, mas o Espírito é o mesmo. E também há diversidade nos serviços, mas o Senhor é o mesmo. E há diversidade nas realizações, mas o mesmo Deus é quem opera tudo em todos” 1 Co 12.4-6. “Mas um só e o mesmo Espírito, realiza todas estas coisas, distribuindo-as, como lhe apraz, a cada um individualmente” 1 Co 12.11.
Não havia na visão de Paulo, um ministério só que concentrasse todos os dons do Espírito que seriam usados na edificação da Igreja, e sim uma multiplicidade de ministérios, todos úteis para o crescimento tanto quantitativo como qualitativo do corpo místico de Cristo, a Igreja.
Paulo compreendia também que a Igreja fora instituída para cumprir diversas funções neste mundo, sendo as mais importantes a adoração (1 Co 14.1-40), a edificação espiritual (Ef 4.11-16), a evangelização (Rm 1.16,17; 1 Co 9.16) e a beneficência (2 Co 8, 9; Gl 6.9,10; 2 Ts 3.13).
V – O Ensino Paulino enfocando a questão social
O apóstolo Paulo, o instrumento de Deus, usado para a produção da maior parte dos escritos do Novo Testamento, não deixou escapar esse assunto de tão relevância na vida da Igreja aqui neste mundo. Paulo não somente trabalhou a questão espiritual em todas as áreas, mas dedicou uma boa parte de seus escritos para trabalhar essa questão que muitos acham que não merece atenção. Ele tinha uma visão holística da Igreja, ou seja, via a Igreja em todas as áreas, tanto no plano espiritual quanto no plano do cotidiano da vida social da mesma, e assim, movido pelo Espírito e pela visão que tinha, feriu esse assunto para servir de regras ou normas para obediência da comunidade eclesial, principalmente no que se refere ao seu testemunho.
Paulo entendia que a pessoa mesmo se tornando cristão pela graça de Deus, regenerada, cidadã do Céu, assentada nos lugares celestiais em Cristo Jesus, possuidora da vida eterna, herdeira de Deus, continuaria a viver na sociedade durante um tempo determinado por Deus. Enquanto vivessem no mundo, essas pessoas estavam inseridas dentro de um contexto social do qual eram participantes ativos. Não há no corpus paulinus (escritos de Paulo) aquela ideia de isolamento, de reclusão visando uma busca de uma vida santificada, afastada das pessoas que vivem no mundo. O que Paulo ensinava era que os cristãos vivessem dentro do contexto social, com uma vida ilibada, santa, deixando transparecer neles a glória de Cristo.
Assim sendo, investiguemos nos escritos de Paulo, os assuntos sociais a seguir identificados:
1) A Escravidão – Esse assunto que para nós do século XXI é um anátema, era para o mundo antigo uma realidade aceita e vivenciada, inclusive nos dias de Paulo. Interessante observar que Paulo sendo um homem capacitado por Deus, com uma ética cristã refinada, não pregou nenhuma rebelião armada ou de qualquer outra maneira nem fomentou nenhuma revolução dos escravos, visando à liberdade. Quando feriu o assunto, ele o fez de forma sutil, principalmente, no que tange as comunidades evangélicas das quais se sentia responsável como apóstolo diante de Deus.
Isso é o que entendemos analisando os seus escritos. “Foste chamado, sendo escravo? Não te preocupes com isso; mas, se ainda podes tornar-te livre, aproveita a oportunidade. Porque o que foi chamado no Senhor, sendo escravo, é liberto do Senhor; semelhantemente, o que foi chamado, sendo livre, é escravo de Cristo” 1 Co 7.21,22. Observe no texto citado, que Paulo alertava aos cristãos escravos a que se aparecesse a oportunidade de se tornarem livres, aproveitassem.
Noutra escritura, na carta a Filemon, Paulo fez uma calorosa petição a um cristão identificado pelo nome de Filemon, em favor de um escravo seu foragido chamado Onésimo, que o apóstolo ganhara para Cristo, quando ambos estava preso em Roma. Nessa carta, Paulo nivela em Cristo a diferença social existente na época, conclamando Filemom a receber Onésimo não mais como escravo, mas como irmão caríssimo no Senhor. “Peço-te por meu filho Onésimo, que gerei nas minhas prisões; o qual noutro tempo te foi inútil, mas agora a ti e a mim muito útil; eu to tornei a enviar. E tu tornas a recebê-lo como às minhas entranhas… não já como servo, antes, mais do que servo, como irmão amado, particularmente de mim: e quanto mais de ti, assim na carne como no Senhor? Assim pois, se me tens por companheiro, recebe-o como a mim mesmo” Fm 10-17.
2) As Relações Trabalhistas – Outro tema abordado por Paulo, dentro da questão macro social, foi o tema das relações trabalhistas, ou seja, a relação entre patrão e servo, entre servo e patrão, no que se refere a execução dos trabalhos e na retribuição pertinente. Paulo se revelou, através de suas instruções, como expert em gerência de recursos humanos, quanto tratou da questão. Sabia ele das tensões nessa área, por isso visando sempre à glória de Deus e as relações harmoniosas dentro da comunidade evangélica, legislou sobre o assunto em três de suas cartas.
Na carta aos Efésios, o grande apóstolo escreveu dirigindo-se aos empregados ou servos nestes termos: “Quanto a vós outros, servos, obedecei a vosso senhor segundo a carne com temor e tremor, na sinceridade do vosso coração, como a Cristo, não servindo à vista, como para agradar a homens, mas como servos de Cristo, fazendo de coração a vontade de Deus; servindo de boa vontade, como ao Senhor e não como a homens, certos de que cada um, se fizer alguma coisa boa, receberá isso outra vez do Senhor, quer seja servo, quer livre” Ef 6.5-8. E aos patrões, assim: “E vós, senhores, de igual modo procedei para com eles, deixando as ameaças, sabendo que o Senhor, tanto deles como vosso, está nos céus e que para com ele não há acepção de pessoas” Ef 6.9.
Na carta aos Colossenses, Paulo escreveu dirigindo-se aos servos nestes termos: “Servos, obedecei em tudo ao vosso senhor segundo a carne, não servindo apenas sob vigilância, visando tão somente agradar homens, mas em singeleza de coração, temendo ao Senhor. Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, temendo ao Senhor. Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o Senhor e não para homens, cientes de que recebereis do Senhor a recompensa da herança. A Cristo, Senhor, é que estais servindo; pois aquele que faz injustiça receberá em troco a injustiça feita; e nisto não há acepção de pessoas”. Cl 3.22-25. Dirigindo-se aos patrões, Paulo disse: “Senhores, tratai os servos com justiça e com equidade, certos de que também vós tendes Senhor no céu”. Cl 4.1.
Na primeira carta a Timóteo, Paulo também trata dessa questão, geralmente tempestuosa: “Todos os servos que estão debaixo de jugo estimem a seus senhores por dignos de toda a honra, para que o nome de Deus e a doutrina não sejam blasfemados. E os que têm senhores cristãos não os desprezem, por serem irmãos; antes os sirvam melhor, porque eles, que participam do benefício, são cristãos amados, Isto ensina e exorta” 1 Tm 6.1,2.
Os cristãos da atualidade também devem se pautar por essas instruções de Paulo, porque foram inspiradas pelo Espírito Santo e entregue a Igreja para obediência. Nessa relação, que muitas vezes torna-se tempestuosa e angustiante, os servos de Deus, tanto no seu papel de senhor como no papel de servo, devem se portar convenientemente para que o nome de Deus e a doutrina não sejam blasfemados.
3) A Obediência às Autoridades – No entendimento de Paulo, a sociedade organizada, com as suas autoridades constituídas eram dádivas de Deus, para possibilitar o funcionamento ordeiro da vida social da mesma. Paulo compreendia e ensinava que toda a autoridade era constituída por Deus, e por isso a obediência a ela se fazia necessária, e quem resistisse às autoridades, estava resistindo a Deus. “Todo o homem esteja sujeito às autoridades superiores; porque não há autoridade que não proceda de Deus; e as autoridades que existem foram por ele instituídas. De modo que aquele que se opõe à autoridade resiste à ordenação de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmo condenação” Rm 12.1,2.
É interessante observar que a carta de Paulo que trata com mais profundidade a questão da obediência às autoridades, aos Romanos, foi escrita a uma Igreja que estava sob a jurisdição política, econômica e social, daquilo que era considerado o centro do império romano – a cidade de Roma, governada, na época, por um dos seus mais cruéis e desajustados governantes, Nero. Escrevendo a Tito (3.1), o apóstolo orientou aquele ministro do Evangelho a instruir a igreja que pastoreava a que se sujeitasse as autoridades e as obedecesse.
Paulo ensinava também que os cristãos orassem pelas autoridades constituídas para que a comunidade cristã tivesse uma vida quieta e sossegada. “Admoesto-te, pois, antes de tudo, que se façam deprecações, orações, intercessões, e ações de graças por todos os homens; pelos reis, e por todos os que estão em eminência, para que tenhamos uma vida quieta e sossegada, em toda a piedade e honestidade. Porque isto é bom e agradável diante de Deus nosso Salvador” 1 Tm 2.1-3.
Evidentemente, que quando Paulo levava os cristãos nessa direção, ele o fazia com critério, porque sabia que a obediência às autoridades não era de uma forma incondicional e que deveria ser feita desde que as leis humanas não colidissem com a lei maior que é a Palavra de Deus. Muitas coisas ruins, comprometedoras e nocivas à fé cristã eram legisladas no império romano como, por exemplo, o culto ao imperador. É claro que a obediência nesse caso não era obrigatória aos olhos de Deus, pois a Bíblia diz que só Deus deve ser adorado. “… Ao Senhor teu Deus adorarás, e só a ele darás culto” Mt 4.10.
Paulo, ainda sobre o assunto, tratou da questão de pagamento de tributos, como uma obrigação legal de todos, inclusive dos membros da Igreja. Escrevendo aos Romanos, disse o apóstolo do Senhor: “Por esse motivo, também pagais tributos, porque são ministros de Deus, atendendo, constantemente, a esse serviço. Pagai a todos o que lhes é devido: a quem tributo, tributo; a quem imposto, imposto: …” Rm 13.6,7. A fraude e a sonegação fiscal estavam fora, na ótica paulina, da ética cristã vivenciada e ensinada por ele.
4) A Beneficência ou ação social da Igreja – Outra questão social trabalhada por Paulo em suas cartas, foi a questão da beneficência.
O apóstolo entendia e ensinava que os irmãos mais abastados financeiramente deveriam ajudar aos irmãos carentes. A ênfase apostólica era de que a ajuda fosse de indivíduo para individuo. “Por isso, enquanto tivermos oportunidade, façamos o bem a todos, mas principalmente aos da família da fé” Gl 6.10. Escrevendo a Timóteo, Paulo voltou a ferir a questão. “Se algum cristão ou alguma cristã tem viúvas, socorro-as, e não se sobrecarregue a igreja…”. 1 Tm 5.16. Ainda nessa mesma carta, quando fazia referência àqueles irmãos a quem Deus dera abastança, Paulo disse: “que pratiquem o bem, sejam ricos de boas obras, generosos em dar e prestos a repartir;…” 1 Tm 6.18.
Paulo entendia, ainda, que a responsabilidade social não era só do cristão enquanto indivíduo, mas de toda a comunidade cristã organizada. Isto percebemos da leitura dos textos: “Se algum cristão viúvas em sua família, socorro-as e não sobrecarregando a igreja, para que esta possa socorrer as que são verdadeiramente viúvas” 1 Tm 5.16. Nessa mesma carta, o apóstolo dá algumas diretrizes a Timóteo quanto ao cadastramento de cristãos carentes para receber a assistência social da Igreja. Na segunda carta aos Coríntios, o apóstolo leva a Igreja a levantar uma oferta para atender aos santos necessitados de Jerusalém (2 Co 8.1-9.15).
É interessante observar que o apóstolo não fez nenhuma observação quanto à causa da pobreza dos irmãos carentes, quer como comunidade quer como indivíduos. Paulo em nenhum momento diz que a pobreza foi ocasionada por falta de profundidade na vida espiritual, ou por pecado cometido, ou por falta de fé. Nem tampouco ele diz que todos os cristãos deveriam ser ricos, abastados, cabeça e não pés. Ele não pregava a Teologia da Prosperidade. O seu coração, cheio do amor de Deus, via apenas a necessidade dos cristãos! Que Deus nos abençoe, nos guarde e nos dê a paz, " LEIA A BÍBLIA, A BÍBLIA ELA NOS FORTALECE, NOS CONSOLA, NOS ORIENTA, NOS CONDUZ, E AINDA NOS ANIMA ".