Complexo de Édipo é um termo psicanalítico criado por Sigmund Freud para explicar o vínculo triangular entre mãe, pai e filho, na fase que vai aproximadamente dos 4 anos de idade da criança até o início da puberdade. Freud cunhou esse termo em sua teoria de estágios psicossexuais do desenvolvimento ou teoria da sexualidade.

  • conceito de Complexo de Édipo, ou seja, o que é o Édipo,
  • o personagem da tragédia clássica grega do mito de Édipo, que inspirou Freud (Édipo-Rei, da tragédia grega de Sófocles),
  • o que seria um Édipo bem ou mal resolvido (e como isso afeta adolescentes e adultos) e
  • atualidade do Complexo de Édipo e sua possibilidade de aplicação para vários formatos de estruturas familiares.

O que é complexo de Édipo?

Complexo de Édipo é um termo basicamente usado para descrever os sentimentos de um menino à sua mãe (atração) e ao seu pai (repulsa). Isto é, o desejo do menino pela mãe e o consequente ciúme que ele sente do pai. É como se o filho visse o pai como um rival, ao querer a atenção e afeto de sua mãe.

Afinal, a criança antes se confundia com a própria mãe durante a gestação. Depois, na fase de amamentação e  nos primeiros meses de vida, a criança começa a se diferenciar da mãe, mas continua tendo da mãe um grande foco de atenção. Gradativamente, a criança sente que a mãe lhe diminui a atenção, e percebe a existência do pai como uma suposta causa.

Freud, em sua teoria do desenvolvimento psicossexual infantil, afirmou que a origem da vida psicossexual se divide em fases, das quais se destacam:

  • Fase Oral: do nascimento até aproximadamente dois anos de idade.
  • Fase Anal: de cerca dos dois anos de idade até cerca de três ou quatro anos de idade.
  • Fase Fálica: dos três ou quatro anos até aproximadamente seis anos de idade, normalmente quando surgiria o Complexo de Édipo.
  • Fase de Latência: dos seis anos de idade até o início da puberdade, quando tende a se declinar ou se dissolver o Complexo de Édipo.

De acordo com Freud, o complexo de Édipo tem um papel muito importante na fase falica do desenvolvimento psicossexual. Para Freud, a conclusão bem resolvida desta etapa envolveria a identificação do menino com o pai, isto é, o menino deixar de rivalizar-se com o pai e passar a aceitar a impossibilidade do incesto. E isso contribuiria para o desenvolvimento de uma identidade sexual madura e independente.

O complexo de Édipo é um conjunto de elementos psíquicos e relacionais que:

  • inicia-se na fase fálica (ou no final da fase fálica) e tende a se resolver na fase de latência (dos 6 aos 13 anos);
  • como regra, é marcado por uma rivalidade com o pai e um desejo pela mãe (e por sua atenção), sendo o oposto também possível (rivalidade com a mãe e desejo pelo pai, especialmente no caso das meninas);
  • pai ou a pessoa que faça a função paterna é ao mesmo tempo uma barreira ao desejo da criança e um ideal que a criança passa a buscar para si, conforme o Édipo vá se resolvendo;
  • superego tende a se formar e fortalecer na fase de latência, em que o pai deixa de ser um oponente (resolvendo o Édipo) e torna-se um exemplo, e quando há a introjeção das regras sociais e morais que a criança/adolescente passará a adotar em sua jornada.

Complexo de Édipo: Resumo da História:

O Complexo de Édipo foi proposto pela primeira vez por Freud em seu livro A interpretação dos sonhos. Ainda que Freud só tenha começado a usar o termo, formalmente, a partir de 1910.

A denominação desse termo é retirada da peça de Sófocles intitulada “Édipo Rei”. Na peça, o personagem Édipo “acidentalmente” mata o seu próprio pai (Laio) e acaba se casando com a sua própria mãe (Jocasta).

A peça “Édipo Rei” de Sófocles faz parte de uma trilogia, que inclui também as obras “Antígona” e “Édipo em Colono”. No enredo de Édipo Rei, o rei de Tebas (Laio) é advertido pelo oráculo para que não tenha filho, pois, se o tivesse, este filho mataria o próprio pai (o rei Laio).

O nascimento e o abandono de Édipo:

Laio não acata o conselho: tem um filho. Depois, temendo a profecia, Laio se arrepende e ordena que o filho seja sacrificado.

Então, um servo do rei Laio deixa o bebê tebano para morrer no Monte Citerão, entre Tebas e Corinto, amarrando o bebê pelos calcanhares, em uma árvore. Entretanto, um pastor coríntio salva o bebê e o leva para sua cidade, onde o bebê é adotado pelo rei Pólibo.

Ao bebê, os pais adotivos dão o nome de Édipo, que costuma ser traduzido como “aquele que tem os pés furados” ou “aquele que foi pendurado pelos pés”.

Já jovem, ao consultar o oráculo de Delfos para saber sobre a sua origem, Édipo ouve uma terrível profecia. A de que o seu destino é matar o seu pai e desposar a sua própria mãe. Para supostamente fugir desta profecia, Édipo abandona Corinto, acreditando que Pólibo é seu verdadeiro pai.

Uma marca das tragédias é o fato de que o destino apresenta “coincidências” e que estas coincidências são inescapáveis, por mais que os personagens tentem fugir delas. E assim será com Édipo, envolto em uma trama inescapável.

Édipo enfrenta a comitiva e, depois, a Esfinge:

Em suas andanças, Édipo encontra por uma estrada um homem idoso (que estava acompanhado de uma comitiva), com quem Édipo acaba discutindo. Então, Édipo mata esse homem e quase toda a sua comitiva, restando apenas um sobrevivente da comitiva.

Quando Édipo chega a Tebas, a Esfinge que afligia a cidade com grandes castigos propõe a Édipo (como a qualquer outro que tentasse entrar na cidade) um enigma: “qual animal tem quatro patas de manhã, duas patas à tarde e três à noite?“.

Édipo desvenda o enigma da Esfinge: a resposta é o homem. No início da vida o ser humano engatinha (4 patas), na idade adulta caminha sobre duas pernas (patas) e, idoso, caminha com duas pernas mais uma bengala (3 patas). Manhã, tarde e noite representariam as fases da vida humana.

Ao responder o enigma, Édipo salva a sua vida e a da cidade: pois a Esfinge se suicida.

Édipo é nomeado rei de Tebas e casa-se com Jocasta:

Como recompensa pela destruição da Esfinge, Édipo é nomeado rei de Tebas e desposa a irmã do então rei Creonte. Esta esposa de Édipo é Jocasta, viúva de Laio, que fora assassinado.

Após 15 anos, uma peste assola Tebas.

O oráculo de Delfos é perguntado sobre o que deve ser feito para salvar a cidade. O oráculo responde que o assassino do rei Laio deve ser punido, só assim a peste seria interrompida. Então, o cego Tirésias diz a Édipo que o assassino de Laio está mais perto do que todos imaginariam.

Nesse momento, um mensageiro de Corinto chega a Tebas e revela que o rei de lá falecera e diz que Édipo é filho legítimo do rei Laio. Também é quando aparece o sobrevivente da comitiva de Laio. Quem, por sinal, é o mesmo homem que abandonara o bebê no Monte Citerão.

Está cumprido o destino trágico na História de Édipo:

O jovem que agora está diante dele é o rei de Tebas, Édipo. Assim, revela-se que Édipo:

  • matou o pai (Laio) e
  • casou-se com a mãe (Jocasta).

E fez as duas coisas “sem saber” que Laio era seu pai e que Jocasta era sua mãe.

Após essa descoberta, Édipo fica desolado. Fura os próprios olhos e, cego, passa a perambular sem destino pelo mundo, como seu castigo. A rainha Jocasta comete suicídio.

O mito de Édipo realmente aconteceu?

Édipo é uma obra teatral trágica atribuída ao grego Sófocles. É uma obra de ficção, embora seja polêmico se haveria uma base de personagens reais (ao menos em parte). Isso porque história, filosofia e arte se misturavam na antiguidade clássica. Mas, obviamente, muito (se não tudo) disso tem a dimensão ficcional. Ainda assim, entendia-se na tradição clássica e na Poética (Aristóteles) que o teatro era forma de conhecimento, por mobilizar:

  • pathos: a emoção, os sentimentos, a catarse;
  • ethos: a conduta ética e moral, ou seja, o julgamento do certo e o errado;
  • logos: a lógica e o conhecimento.

Da mesma forma ocorre com o mito de narciso (que se afogou nas águas) deu origem à expressão narcisismo, e tantas outras expressões que herdamos da tradição greco-romana.

A questão é que Freud não toma o Édipo como uma inauguração do que os seres humanos depois disso passariam a viver.

Mas sim a partir da pergunta: por que essa tragédia de 2.500 anos atrás ainda hoje é tão marcante e nos comove tanto, ainda que inconscientemente? Por que o “sem querer querendo” de Édipo mobiliza nossa empatia, seríamos também capazes do que Édipo fez ou alguma vez ambiguamente desejamos isso?

Por exemplo, em Sófocoles o inescapável (típico das tragédias) é anunciado pelo Oráculo (determinação divina), mas, para o complexo de Édipo, Freud não vê como um desejo divino, mas como parte do desenvolvimento psicossexual e do inconsciente da criança, um junção entre a predisposição biológica e o convívio social.

Então, a questão para Freud não é construir o humano como cópia do mito, mas sim pensar que este mito é “cópia” (mimesis) do humano, é construção humana (e as razões para ter comovido naquela época e nos comover até hoje).

Outras perguntas: “por que em praticamente todas as culturas o incesto é (e era) um tabu?“; “por que é tão forte o apego do menino pela mãe?”; “seria razoável pensar que o pai pode ser visto por este menino como um seu rival, que lhe rouba a mãe?”.

Então, Freud toma o mito de Édipo como alegoria para propor um Complexo de Édipo, que trata do desejo do menino pela mãe, a rivalidade com o pai, e os custos sociais (superego) de quando a interdição do incesto não é respeitada. Mesmo quem rejeite o complexo de Édipo terá que propor uma teoria psicológica sobre como a mente se forma na idade infantil e quais as influências das funções materna/paterna nisso.

Características do Complexo de Édipo: Freud:

Todos os seres humanos devem a sua origem a um pai e a uma mãe. Para Freud, não haveria, assim, como escapar dessa triangulação (bebê – mãe – pai), a qual constitui o centro do conflito humano. Essa triangulação define a estrutura psíquica do sujeito. E ela não está presente apenas na infância do sujeito, mas em toda a sua vida.

Complexo de Édipo é um conceito universal para a compreensão sobre o que é psicanálise. Um conceito que fala sobre sentimentos como o amor e o ódio, quando direcionados àqueles que mais nos são próximos, nossos pais. É também uma teoria sobre a maturidade psíquica: um sujeito só se torna psiquicamente autônomo quando supera a infantilização da fase de dependência a seus pais.

fase fálica começa a trazer à criança várias proibições até então desconhecidas. É quando a criança começa a perceber que a sociedade lhe impõe regras, limites e costumes. A criança já não pode mais fazer o que quer (seu id não pode ser plenamente atendido), e a sua liberdade começa a ser cerceada, em função de uma vida social mais complexa, com novos agentes.

Nesse momento, a criança começa a identificar mais claramente as distinções entre si e os seus genitores. Sendo, portanto, uma das fases mais importantes do desenvolvimento, psicológico e sexual. Segundo Freud, os reflexos da idade edipiana poderá se refletir por toda a vida adulta do sujeito. Inclusive em sua vida sexual, sua realização profissional, sua maturidade psíquica, sua capacidade de se relacionar afetivamente com outras pessoas etc.

O superego é herdeiro do Complexo de Édipo:

Conforme ocorra a superação bem resolvida do complexo de Édipo, vai se estruturando o superego. Atua como uma autoridade moral internalizada pela pessoa. Por isso, este momento de superação é, para Freud, essencial ao desenvolvimento psicossexual do indivíduo.

Diz-se que o superego é o herdeiro do Complexo de Édipo, afinal:

  • função paterna como detentora da moral se impõe sobre a criança, que deve aceitar a impossibilidade de derrotar o pai, identificando-se com este;
  • isso se dá na forma de uma introjeção psíquica no superego: e a criança, por um processo metonímico, passa a aceitar também a existência de uma moral social.

No livro Mal Estar da Civilização. Freud sugere que o mito de Édipo está na base não só do indivíduo, mas também na base da cultura. A escola, a religião, a moral, a família, o poder de polícia, os ideais de normalidade, as leis são alguns exemplos de construções sociais que buscam impor aos mais novos as regras que vão preservar o status quo das gerações anteriores.

Assim como o pai faz em relação ao filho, a sociedade criaria a cultura (sinônimo de civilização, em Freud) e todos os seus aparelhos em razão do temor de que os jovens (os “filhos”) ataquem as regras de funcionamento que já organizam esta sociedade.

O tabu do incesto:

A expressão “incesto” pode parecer muito forte à nossa moral adulta. Podemos pensar que isso é incabível à concepção de uma criança.

Mas devemos lembrar que, possivelmente,

  • tabu do incesto só é forte no mundo adulto porque, quando crianças, o introjetamos, ainda que não nos recordemos disso;
  • psique do bebê não nasce pronta: é até lógico supormos que este amontoado de pulsões destine seus primeiros afetos pulsionais em direção à mãe, primeiro porque não se distingue dela;
  • bebê nasce apenas com o id (apenas pulsões e um instinto em buscar satisfação), sendo que só depois desenvolverá o ego (para se diferenciar do resto) e o superego (para introjetar a moral);
  • a maior parte do tempo, a criança convive com sua mãe e seu pai: é de se supor que se direcionem a estas pessoas seus afetos de amor e ódio.

Complexo de Édipo bem e mal resolvido:

Diz-se que há um Édipo mal resolvido quando uma pessoa em idade adulta apresenta sinais que deem a entender que ela não superou adequadamente o Complexo de Édipo na passagem da infância para a adolescência.

Significa que a pessoa ainda apresenta sinais:

  • de estar ainda vivendo o Complexo de Édipo, ou
  • de querer reviver aquela época em que tinha desejo pela mãe (ou pelo pai) e rivalizava com o pai (ou com a mãe).

Por outro lado, diz-se que o Complexo de Édipo foi bem resolvido quando, nesta passagem da infância/adolescência, a pessoa aceita a impossibilidade do incesto com a mãe (ou o pai) e a impossibilidade de continuar odiando ferozmente o pai (ou a mãe). A partir desta aceitação, passa a focar seus afetos e energia libidinal em outras pessoas e coisas. É de certa forma normal haver um distanciamento em relação aos pais, tão comum a partir do início da adolescência.

O Complexo de Castração:

Quando Freud elaborou a ideia de um Complexo Edipiano, imaginou essencialmente a referência aos meninos. Depois, especialmente no texto “A dissolução do Complexo de Édipo” (1924), propôs algumas diferenças entre meninos e meninas na questão edipiana.

Freud considerava que o primeiro afeto de uma criança (menino ou menina) é sempre pela mãe. Isso porque a criança está em seu começo de diferenciação e desenvolvimento. É natural que o amor se volte para a pessoa com quem a criança mais teve contato.

A diferenciação entre meninos e meninas aconteceria num segundo momento do Édipo, como explicaremos a seguir.

Basicamente, a menina pode passar a ter afeto pelo pai e rivalidade com a mãe, que é vista como sua concorrente. Além do mais:

  • temor da castração, que nos meninos representa o medo de perder o pênis,
  • na menina pode ser entendido como a castração já realizada (falta do pênis).

Freud até supõe que o complexo de castração seja universal: no menino, o temor; na menina, a castração imaginariamente já realizada. Mas poderia também ser remetido a outros símbolos típicos de temores. 

No verbete “Complexo de Castração“, do Vocabulário de Psicanálise de Laplanche & Pontalis, há formas mais amplas de ver a questão:

“… a fantasia de castração é encontrada sob diversos símbolos:

  • o objeto ameaçado pode ser deslocado (cegueira de Édipo, arrancar dos dentes, etc.),
  • o ato pode ser deformado, substituído por outros danos à integridade corporal (acidente, sífilis, operação cirúrgica), e mesmo à integridade psíquica (loucura como conseqüência da masturbação),
  • agente paterno pode encontrar os substitutos mais diversos (animais de angústia dos fóbicos).

O complexo de castração é igualmente reconhecido em toda a extensão dos seus efeitos clínicos: inveja do pênis, tabu da virgindade, sentimento de inferioridade, etc.; as suas modalidades são descobertas no conjunto das estruturas psicopatológicas, em particular nas perversões…”

Obviamente o complexo de castração não é literal apenas no sentido da perda do pênis. Pode ser delocado, deformado ou substituído para outros temores. E até mesmo o agente castrador pode não ser (na cabeça da criança) apenas o pai, pode ser outra pessoa ou objetos fóbicos. Não é uma castração no sentido literal. Inclusive, até mesmo o temor da castração pode não ser literal, pois pode ocorrer de diferentes formas em diferentes pessoas.

Costuma-se entender em psicanálise a castração como uma alegoria das interdições. Assim, quando um paciente diz que teve uma “família castradora”, possivelmente esteja querendo dizer que a família impôs regras rígidas demais e um pensamento baseado em regras dogmáticas e autoritárias.

A diferença do Édipo em meninos e meninas:

Em termos de afeições e rivalidades com pai/mãe e a fase de maior autonomia e do superego que deve vir com a resolução (dissolução ou encerramento) do Complexo de Édipo, entende-se que o fenômeno ocorre tanto com meninos e meninas.

O que pode variar é com quem o menino se identifica (mãe ou pai) e com quem rivaliza. Da mesma forma, com a menina, que pode se identificar mais com o pai e rivalizar com a mãe.

Embora seja o chamado “padrão”:

  • atração da criança pelo(a) pai/mãe de sexo oposto e
  • rivalização com o(a) pai/mãe de mesmo sexo,

é possível também haver uma atração do menino para com o pai e uma rivalidade para com a mãe. E, na menina, uma atração pela mãe e uma rivalidade com o pai.

Em termos da psique humana e da complexidade das relações afetivo-familiares, entende-se hoje que é temerário arriscar uma universalização. Há que se olhar para cada história.

Ainda assim e mesmo com críticas ou adaptações ao modelo edipiano original, é possível ao analista:

  • olhar para cada realidade familiar e de formação da criança, e
  • entender que existam as atrações e rivalidades sugeridas pelo Complexo de Édipo,
  • tanto para meninas quanto para meninos,
  • e ver como o Édipo pode ter ocorrido em cada caso, de maneira a marcar a formação da personalidade até a vida adulta.

Alguns autores seguem uma linha do psicanalista Carl Gustav Jung  no sentido de denominar esta fase análoga ao Complexo de Édipo para as meninas como Complexo de Electra. Freud, por sua vez, preferiu denominar apenas como Complexo de Édipo e, em alguns ajustes, diferenciar sua manifestação e sua resolução entre meninos e meninas.

As funções de pai e de mãe no Complexo de Édipo:

É importante entendermos:

  • a função de mãe: que pode ser sintetizada com as ideias de proteção e amor, um ideal de volta ao passado e de possibilidade de realização dos desejos do Id, de quando a criança tinha a proteção uterina e a atenção integral da mãe (na verdade, quando a criança se confundia com a mãe);
  • a função de pai: que seriam os limites impostos pelo dever, um ideal de caminhar para o futuro e de independência, que pode impor o receio ou angústia ao novo para a criança, razão para a criança nutrir ainda maior animosidade em relação ao pai.

Estas funções independem se de fato há uma mãe e um pai como casal. A função de afeto e a função de dever podem ser desempenhadas por outras pessoas e outras composições familiares, por pais adotivos, por famílias complexas (em que avôs/tios etc. convivem no mesmo ambiente) e até mesmo uma mãe ou um pai sozinhos.

Para além do Édipo e outros modelos familiares:

Passado mais de um século desde a elaboração freudiana, é fato que o Complexo de Édipo permanece como parte da compreensão do desenvolvimento psicossexual infantil e como parte da compreensão das regras impostas pela vida em sociedade.

Também houve críticas e complementações acerca da teoria freudiana (dentro da psicanálise, da psicologia, da filosofia, da pedagogia e da sociologia), especialmente quanto aos riscos da universalização da teoria freudiana, aos outros formatos de família e ao desenvolvimento de bebês do sexo feminino.

Mesmo os psicanalistas que buscam atualizar a obra freudiana precisam oferecer em seu lugar, assim como Freud o fez, uma teoria sobre:

  • Como a psique humana se forma e se diferencia / desapega da mãe etc.?
  • Como ocorre a passagem da criança em direção à autonomia?
  • Quais os momentos e eventos de passagem em direção à maturidade psíquica?
  • Quais os reflexos na vida adulta dos eventos (ou sua falta) necessários a esta transição psíquica?

No Livro “Édipo: o complexo do qual nenhuma criança escapa”, o psicanalista J.D.Nasio, amplia a triangulação do Complexo de Édwipo para situações em que a mãe não mora com o pai. De certa forma, a mesma ideia de Nasio poderia ser aplicada a quaisquer modelos de família:

“Pergunta: como se dá o Edipo quando a mãe vive sozinha com o filho?

Resposta: Plenamente, sob a condição de que a mãe seja desejante. Pouco importa que a mãe viva sozinha, o que conta é que seja apegada a alguém, que deseje alguém; e, no caso de não ter nenhum parceiro amoroso, o que conta é que seja interessada por outra coisa que não o filho, que o amor pelo filho não seja o único amor de sua vida. Em suma, há o Edipo a partir do momento em que a mãe deseja um terceiro entre ela e o filho. Eis o pai! O pai é o terceiro que a mãe deseja.”

Como se Resolve o Complexo de Édipo?

A forma de resolver o Édipo também pode ser diferente em meninos e meninas. Em ambos, resolver (ou superar) significa a saída do Édipo: isso passa por aceitar a impossibilidade de incesto, introjetar esta norma moral e destinar o afeto de amor/ódio para outros objetos.

Complementando estes pontos em comum, Freud propões especificiadades:

  • No menino: aceitar a impossibilidade do incesto com a mãe, superar a rivalidade com o pai e introjetar o pai como um símbolo de referência moral.
  • Na menina: aceitar a impossibilidade do incesto com o pai, superar a rivalidade com a mãe e canalizar sua energia para um afeto substituto, em especial a maternidade.

Para resolver esta fase edipiana, é necessário desenvolver uma identidade saudável e mais autônoma. A criança deve:

  • identificar-se com o genitor do mesmo sexo (o menino com o pai, a menina com a mãe) e
  • deixar de desejar o genitor de sexo oposto.

Assim, a criança resolve o conflito incestuoso e característico do Complexo de Édipo.

A demanda colocada aos pais na educação psicológica da criança é permitir que a criança se autonomize e deixe de colocar seu afeto (amor e animosidade) apenas em relação ao núcleo familiar.

Para isso, a criança (e, depois, o adolescente) buscará outros ideais e objetos, como brinquedos, amigos, professores, super-heróis, artistas etc. E, por vezes, até mesmo rejeitará a atenção dos pais. Isso é comum como a diferenciação necessária à autonomia.

De acordo com Freud, essa fase edipiana envolve o id e o ego da seguinte forma:

  1. O primitivo id quer eliminar o pai, e o ego, realista, sabe que o pai é muito mais forte.
  2. É quando surge a angústia de castração no menino, que teme que o pai mais forte se imponha contra ele.
  3. Ao descobrir as diferenças físicas entre o homem e a mulher, a criança acha que o pênis do sexo feminino foi removido.
  4. Com isso, o menino também acha que o seu pai irá castrá-lo por desejar a sua mãe: é o chamado complexo de castração. 
  5. Para resolver esse conflito, o filho deve ceder e se identificar com o pai. Isto é, aceitar o pai, manter uma relação com o pai e elaborar um apreço à figura paterna. Afinal, se o filho desafiar o pai, estará numa posição vulnerável depois.
  6. Ao mesmo tempo, o filho deve abdicar-se do incesto com a mãe (você, psicanalista, não interprete isso pela via moralista, pense que esta atração da criança é pulsional e ainda é confuso para a sexualidade e a personalidade em formação).

Basicamente, para superar o complexo de Édipo e seguir em frente, o filho deverá aceitar a supremacia do pai e a impossibilidade de ter o amor conjugal pleno com sua mãe. Assim, o “eu” estará livre para se fixar a outros objetos de amor. Isto é, realizar-se com outra pessoa, ter uma profissão, assumir um papel de responsabilidade pessoal, familiar e social.

Diz-se que houve um complexo de Édipo mal resolvido quando a criança não consegue fazer esta passagem de afeto, mantendo-se infantilizada na idade adulta, insegura em relação a ambientes e pessoas, incapaz de assumir responsabilidades, presa ao afeto/proteção da mãe e à rivalidade com o pai, não conseguindo tomar decisões sozinha, projetando em outras pessoas o papel de pai/mãe.

Sinais no adulto de um Édipo bem ou mal resolvido:

Por esta visão de J. D. Nasio, o complexo de Édipo seria universal, isto é, todas as crianças passariam por ele, independentemente do modelo familiar. Bastaria o desejo que a mãe tenha por outra pessoa (ou até mesmo “coisa”, como o trabalho etc.) e que isso seja visto pela criança como “roubando-lhe” a mãe.

Neste sentido, o Complexo de Édipo bem resolvido não dependeria do formato familiar, mas sim ocorreria quando a criança (até provavelmente perto da adolescência) conseguisse:

  • ir se desprendendo deste desejo pela mãe e do desejo que a mãe lhe deseje e lhe seja exclusiva; e
  • deixar de conflitar ou rivalizar com o pai (ou quem ocupe este lugar, no ponto de vista da criança),
  • de forma que a criança passe a destinar seu afeto a outras pessoas, coisas, sonhos profissionais etc., com maior autonomia.

Do lado oposto, um Complexo de Édipo mal resolvido seria quando a criança não se desapega do desejo pela mãe e não consegue deixar de conflitar com seu pai. Normalmente, isso reflete-se em condições diversas inclusive na idade adulta, como:

  • a incapacidade de se relacionar de maneira saudável com outra pessoa,
  • auto-estima frágil ou baixa
  • incapacidade de assunção de responsabilidades e relacionamentos,
  • elevado grau de dependência em relação a outras pessoas,
  • comportamento infantilizado e assunção de conceitos infantis,
  • projeção das funções de pai/mãe em outras pessoas,
  • revivência da condição de filho(a) no relacionamento com outras pessoas,
  • angústia ou ansiedade em circunstâncias em que sente perder o ideal de “escudo protetivo” que trazia da infância,
  • superproteção aos próprios filhos, como forma de reviver a dependência emocional do seu Édipo.

Como a psicanálise trata o Édipo mal resolvido em adultos?

Observe que alguns dos “sintomas” enumerados acima podem ter outras razões. É a combinação de alguns destes fatores que permitem-nos suspeitar de um Édipo mal resolvido. Entendemos que não seja possível nem relevante rotular alguém como tendo um complexo de Édipo mal resolvido.

O psicanalista experiente em clínica buscará outro caminho: naturalmente, reflexões sobre a convivência com o pai ou a mãe (ou a falta desta convivência) surgirão na livre associação que o analisando (paciente) fará. Caberá ao psicanalista propor elaborações a respeito destes vínculos e as reverberações em fase adulta, isso de forma qualitativa.

Na medida em que estas temáticas e estes “sintomas” sejam repetitivos, o analista poderá ir firmando sua tese da questão edípica, mas ainda assim pronunciar ao analisando que ele é um caso de Édipo mal resolvido parece pouco proveitoso. O importante será avançar a terapia em favor de um melhor bem-estar que o fortalecimento do ego pode propiciar.

Mesmo na idade adulta, é possível buscar esta resolução do Édipo. A nosso ver, embora não seja mais possível “voltar no tempo” e mudar as relações com pai/mãe, é possível ao adulto buscar o fortalecimento do ego, em terapia psicanalítica:

  • compreendendo melhor a si e seus processos mentais,
  • superando ou minimizando os mecanismos de defesa do ego (como a projeção),
  • lidando melhor com as demandas da realidade externa e
  • melhorando a qualidade de suas relações interpessoais.

Casais com grandes diferenças de idade são sinais de Édipo mal resolvido?

Uma pessoa que busque se relacionar com um(a) parceiro(a) mais velho(a):

  • Seria sinal de um Édipo que foi mal resolvido e que permanece na idade adulta?
  • Seria indício de buscar reconstruir a relação afetiva edipiana, com um substituto para o pai ou para a mãe?

Entendemos que existe esta possibilidade, mas a generalização é muito perigosa.

Quão mais velho precisaria ser o parceiro para que haja esta conclusão? Três anos, 10 anos, 20 anos, 30 anos? Entendemos que é muito relativo, não é possível alcançar uma determinação exata. Seria preciso conhecer melhor cada caso. Cada psique é única em sua constituição.

Talvez um comportamento infantilizado e uma dependência emocional exagerada em relação ao parceiro poderiam ser elementos um pouco mais fortes de um Édipo mal resolvido do que uma questão apenas de constatação de diferença de idade.

Se disséssemos o contrário, seríamos levianos. Bastaria UM exemplo de um casal em que a pessoa mais jovem apresenta mais maturidade e um ego mais fortalecido, e a pessoa mais velha seria mais imatura e com outros indícios de um Édipo mal resolvido para derrubar por terra a tese da diferença de idade nos relacionamentos como sendo um fator edipiano.

Centralidade e Universalidade no complexo de Édipo:

Na psicanálise, fala-se sobre:

  • centralidade do Édipo: este complexo como sendo um fator central para entendimento da psicanálise e da psique humana;
  • universalidade do Édipo: este complexo como sendo um fator universal, isto é, aplicável a todas as crianças.

O caráter universal do complexo de Édipo seria um ponto polêmico. A defesa deste ponto de vista decorre de uma razão biológica no desenvolvimento psíquico humano. Ademais, toda criança ampara-se no relacionamento com adultos, por mais falhos que este seja.

Por outro lado, o aspecto cultural seria responsável por diferentes manifestações desta interação. Uma forma de conceber um entendimento a respeito é pensar que o biológico e o amparo do(s) adulto(s) contribuem com o caráter universal do Édipo, enquanto as diferentes culturas, orientações, interações com os adultos e as diferentes personalidades determinariam o aspecto cultural ou idiossincrático do Édipo.

Ainda quem rejeite o complexo de Édipo, reconhece haver elementos edipianos aplicáveis. É parte da reflexão de Édipo que um psicanalista, psicólogo, pedagogo ou filósofo deve responder: como se dá a passagem da criança/adolescente para a autonomia? Deixar de rivalizar com o pai é parte disso? Dá-se por temor? Coincide com o momento da vida em que a criança percebe as interdições? Como o Édipo se vincula à perda e posterior destino a outros afetos? E quando não há determinado desenvolvimento, isso afeta a forma de ser e conviver do adulto?

Enfim, são questões que na psicanálise/psicologia praticamente se inauguraram com Freud e que outros psicanalistas e pensadores de diversas áreas se debruçariam depois. Questões que abrem a quem recusa o Édipo e que, no lugar, precisa pensar esta transição.

Todas as ideias da psicanálise podem ser questionadas (obviamente isso demanda uma porção de leitura), a questão a nosso ver é buscar entender a ideia inicial e pensar articulações de como isso pode ser refutado, ampliado ou confirmado.

A atualidade do Complexo de Édipo:

Para alguns psicanalistas como Donald winnicott, o Édipo não é tão central no desenvolvimento psíquico. Na verdade, Winnicott parte da ideia edipiana de Freud, mas imagina que este aspecto de identificação / diferenciação em relação especialmente à mãe ocorra mais cedo na vida do bebê e não necessariamente tenha uma relação direta com períodos bem marcados de fases de desenvolvimento psicossexual.

Não há que se tomar o Complexo de Édipo necessariamente como uma relação literal. Há que se pensar o desejo pela mãe (ou pelo pai) não só como sexual, mas por todo o caráter simbólico e protetivo que representa.

Existem nuances, a depender de cada unidade familiar. Daí se discuta hoje se o Édipo seria de fato universal (isto é, aplicável a todas as crianças). Na visão de J. D. Nasio, sim.

Podemos pensar em funções paterna/materna, em vez de figuras estanques. Podemos pensar quais pessoas representam para a criança os ideias de amor/proteção e de animosidade/independência. E também pensar que, embora haja uma preponderância de sentimentos em relação a cada um dos pais, a criança não vê o pai/mãe apenas como adversário ou apenas como afeto.

Nas fases fálica/latência que concide com a temática edipiana, costuma-se também despontar até mesmo uma orientação para a sexualidade, conforme o menino / a menina se sintam mais envolvidos por sua mãe / seu pai.

O afeto que a criança tem pelo pai não é somente hostilidade, nem pela mãe é somente amor. Podemos pensar talvez numa supremacia de um ou de outro sentimento para com cada progenitor. Mas há que se considerar a ocorrência de ambos os sentimentos antagônicos direcionados a uma mesma pessoa, o que em psicanálise se chama de ambivalência. 

Além disso, há que se pensar a relação do Complexo no desenvolvimento diferente de meninos e meninas e também nos diferentes modelos familiares (mãe sozinha, pai sozinho, duas mães, dois pais, adoção tardia, criação por avós etc.). E pensar que até mesmo dentro de cada conjunto (menino/menina) existam diferenças, por causa do caráter único de cada sujeito." SEJA FONTE DE AMOR "