sábado, janeiro 20

TRANTORNO DISMÓRFICO CORPORAL: O QUE É? QUAIS OS SINTOMAS? COMO TRATAR?

O Transtorno dismórfico corporal (TDC) caracterizado pela preocupação com a percepção de um ou mais defeitos na aparência física, os quais não são percebidos por outras pessoas, além disso, desenvolvem comportamentos repetitivos, por exemplo, arrumar-se excessivamente ou verificar-se no espelho. Diante disso, como não reconhecem seu defeito como mínimo ou inexistente, costuma procurar tratamentos cosméticos para um transtorno psíquico. Esses defeitos podem ter foco em qualquer área do corpo (peso, olhos, formato do rosto, mama, genitais, assimetria de áreas corporais).

Diferentemente do transtorno alimentar, no qual as preocupações são sobre gordura e peso corporal, os indivíduos com transtorno dismórfico corporal observam e acreditam que sua estrutura corporal é muito pequena e pouco musculosa. Esses indivíduos apresentam algum grau de prejuízo no funcionamento social.

Epidemiologia:

A prevalência do TDC não é bem determinada. Estima-se que acometa, na população geral, de 1% a 2%. Além disso, nota-se maior predomínio em pacientes psiquiátricos e pacientes que procuram consultas clínicas na dermatologia e cirurgia plástica.

Em geral, é iniciado na infância, os pacientes podem sofrer por até onze anos antes que procurem tratamento específico. Além disso, não parece haver diferenças entre os gêneros.

Fisiopatologia:

A fisiopatologia do TDC ainda é desconhecida, no entanto, foi observado casos com ativação cerebral que mostram padrões de percepção visual, imagem corporal distorcida e processamento emocional. Diante disso, apresenta uma combinação de disfunções no circuito fronto-estriatal, entre os hemisférios cerebrais, além da amigdala e ínsula, mediando sintomas e déficits neuropsicológicos.

Ademais, percebe-se funções anormais de serotonina e dopamina no desenvolvimento da patologia. Há relatos que demonstram como gatilho para o desenvolvimento do TDC ou exacerbação dos sintomas, doenças inflamatórias que interferem na síntese de serotonina, após lesão na região do lobo frontotemporal.

Podendo ser observado padrões de hereditariedade, 8% dos indivíduos com TDC possuem um membro da família com esse diagnóstico. Além disso, nota-se que 7% dos pacientes com TDC possuem hereditariedade com o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC).

Fatores psicológicos
Teoria psicanalítica: 

O deslocamento inconsciente de conflitos sexuais e/ou emocionais, distorção da imagem corporal, sentimentos de inferioridade expressa o TDC.

Teoria cognitivo-comportamental: 

da interação entre fatores emocionais, comportamentais e cognitivos (atitudes não realistas sobre imagem corporal relacionados à perfeição e simetria e aumento monitoração exagerada da presença de defeitos na aparência) surge o TDC.

Quadro Clínico:

O TDC é considerado crônico, os sintomas podem ocorrer de forma gradual ou súbita.

Os indivíduos podem se incomodar com a forma ou tamanho de uma ou mais partes do corpo, por exemplo, nariz e pernas. Podem focar em acne, perda de cabelo, cor e ainda podem ter uma forma chamada dismorfia muscular, mais comumente em homens, na qual a preocupação se dá com a ideia de que seu corpo não é musculo e magro o suficiente. 

Normalmente os pacientes descrevem o corpo ou a parte que não gostam como monstruosas, feias e deformadas.

Além disso, há comportamentos compulsivos como comparar a aparência com a de outras pessoas, higiene excessiva, troca de roupas, escoriação da pele e arrancar cabelos (tricotilomania).

O funcionamento social é comprometido pelas preocupações acerca da aparência, evitam aparecer em público.

Cerca de 30% das pessoas com TDC tentam suicídio, no entanto, aproximadamente 80% dos pacientes, ao longo da vida, vivenciam ideação suicida. Além disso, isolamento social e depressão também são quadros comuns nesses indivíduos.

Diagnóstico:

A inclusão do TDC no “Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders” (DSM) e no “International Classification of Mental and Behavioural Disorders” (CID) se deu apenas em 1980, durante muito tempo foi considerado como sintoma de outras doenças psiquiátricas como esquizofrenia, transtornos de humor ou de personalidade.

No entanto, antes da década de 80, nota-se relatos de pacientes com sintomas consistentes com o TDC, descritos na literatura como dismorfofobia ou hipocondria dermatológica.

Atualmente, os critérios para diagnóstico são:

Preocupação excessiva com um ou mais defeitos percebidos na aparência e que não são identificados para outras pessoas.
Execução de comportamentos repetitivos (por exemplo, se arrumar excessivamente ou se olhar no espelho).
A preocupação causar sofrimento e prejuízo na vida social e profissional.
Essas queixas não podem ser caracterizadas por outro diagnóstico como o transtorno alimentar.
Há, ainda, a indicação sobre o insight em relação as crenças do TDC:

Insight bom ou razoável: 

O indivíduo reconhece que as crenças do transtorno dismórfico corporal podem ou não ser verdadeiras.

insight pobre:                                  

O indivíduo acredita que as crenças do transtorno dismórfico corporal são provavelmente verdadeiras.

Insight ausente/crenças delirantes:                                        

Oindivíduo está convencido de que as crenças do transtorno dismórfico corporal são verdadeiras.
Diagnóstico Diferencial
Transtornos alimentares.
Transtornos de ansiedade.
Transtorno depressivo maior.
Transtornos psicóticos.

Tratamento:

Inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS).
Clomipramina (Antidepressivo tricíclico).
Psicoterapia (Terapia cognitivo-comportamental).
Os pacientes respondem com redução do incômodo e das preocupações, redução dos comportamentos repetitivos e melhora do funcionamento social.

Treinamento de conscientização, exercícios comportamentais e técnicas cognitivas são estratégias usadas na terapia cognitivo-comportamental.

quinta-feira, janeiro 18

ABDÔMEN AGUDO OBSTRTRUTIVO: ETIOLÓGIA E TRATAMENTO!

O abdome agudo obstrutivo corresponde a, aproximadamente, 20% dos casos de abdome agudo no departamento de emergência. É caracterizado por uma parada de progressão do trânsito intestinal.

Sinais e sintomas do Abdome Agudo Obstrutivo:

Os sinais e sintomas do Abdome Agudo Obstrutivo podem ser explicados pela fisiopatologia da doença.

Quando o trânsito intestinal é interrompido, a parte proximal se dilata e a distal se esvazia. Isso gera uma pressão intestinal, aumentando a força contrária à obstrução, na tentativa de vencê-la.

Como resultado, o fracasso dessa tentativa leva a um sequestro de líquidos para o 3º espaço, reduzindo a perfusão, aumentando a isquemia e necrose.

A partir disso, uma " Tríade Clássica " do abdome agudo obstrutivo é:

Dor abdominal + Distensão abdominal + Parada de eliminação de fezes e flauta.

Paciente com abdome agudo obstrutivo em necrose.
Outros sintomas comuns costumam ser náuseas e vômitos, além de diarreia paradoxal (explosiva) e desidratação.

É importante que o profissional de saúde esteja muito atento, ainda, às possíveis complicações de um abdome agudo obstrutivo. Dentre elas, estão a sepse e a peritonite.

Por esse e outros motivos, a observação atenta do quadro é vital para que sejam tomadas as condutas terapêuticas e diagnósticas com brevidade. Ao exame físico, devido a obstrução, podem estar bem diminuídos, avançando para ausência total. Acompanhada da obstrução ainda, a cólica costuma ser muito presente.

Podemos entender que,  ainda devido à obstrução, o abdome do paciente estará hipertimpânico à percussão.

Como o abdome agudo obstrutivo pode ser classificado?

A classificação do abdome agudo obstrutivo é extensa, mas é fundamental para uma compreensão completa e determinante do quadro.

Ela pode ser classificada em:

Alta ou Baixa;
Parcial ou Total;
Mecânica ou Funcional;
Complicada ou não complicada.
Obstrução intestinal alta ou baixa?
Considerando a anatomia do intestino, tanto delgado quanto grosso, o abdome agudo obstrutivo pode ser classificado como " Alta e Baixa ".

A obstrução alta acontece no intestino delgado. Alguns sintomas comuns dessa classe são os vômitos biliosos, além de alcalose metabólica. Pensando nas causas desse tipo, podem ser devido a bridas, alguma hérnia interna, tumores ou, em casos mais frequentes em crianças, 
Benzor, aderência pós-operatória sendo seccionada com eletrocautério. 

Já a obstrução baixa se refere às regiões de cólon e reto. Diferente da alta, o paciente apresenta vômitos mais tardios, com odor fecalóide. Essa é, inclusive, sintomas que podem chamar atenção para possível neoplasia colorretal.

Quando a obstrução intestinal é parcial ou total?

Ainda, a obstrução pode ser Parcial ou Total. Quando parcial, o paciente ainda consegue evacuar, enquanto que na total a oclusão é completa, não havendo evacuação.

Alça aberta e alça fechada: o que isso significa no abdome agudo obstrutivo?

A obstrução de alça fechada ocorre oclusão em 2 pontos diferentes do trato intestinal (pontos proximal e distal- válvula ileocecal e sigmoide).

Nesse caso, diz-se que a válvula ileocecal é competente e o fluxo é unidirecional, impedindo o retorno do conteúdo para o delgado. Com isso, as fezes podem retornar para o delgado e ocorrer o vômito fecalóide.

Analisamos a obstrução em alça fechada no raio x de abdome, onde podemos ver a distensão do ceco ou volvo de sigmoide. Se o ceco apresentar distensão acima de 12 cm, ele está em iminência de rotura e é indicação de laparotomia.

Causas do abdome agudo obstrutivo:

Muitas podem ser as causas do abdome agudo obstrutivo, sendo as mais comuns:

Aderências (bridas) é a causa mais comum em pacientes com história de cirurgia prévia (a brida é mais comum no intestino delgado).

Câncer colorretal – causa mais comum em pacientes sem cirurgia prévia e em obstrução no CÓLON.

Hérnias encarceradas
Volvo
Intussuscepção
Íleo biliar
Fecaloma
Síndrome de Ogilvie
Doenças metabólicas.

Quais exames complementares solicitar para o paciente com abdome agudo obstrutivo?

É importante que o paciente seja investigado laboratorialmente, além dos exames de imagem. Esse é um cuidado vital para esse tipo de pacientes, devendo ser solicitados no momento inicial e após isso diariamente.

Dentre eles, são necessários:

Hemograma completo;
Função renal;
Eletrólitos;
Gasometria;
Lactato;
Amilase.

Apesar de esses exames serem necessários, os resultados são inespecíficos, podendo haver leucocitose e evidências de desequilíbrio ácidobásico.


Radiografia simples na investigação do abdome agudo obstrutivo
Os exames de radiografia simples, é possível observar presença de gás no intestino delgado com níveis hidroaéreos e dilatação de alças sugere obstrução intestinal.

As radiografias simples de abdome e tórax são capazes de trazer informações úteis quanto ao tipo, ao grau de evolução, à presença de complicações e até à etiologia da obstrução intestinal.

As mais solicitadas, em geral, são os Raio-x’s de:

Tórax póstero-anterior em posição ortostática;

Abdome anteroposterior em decúbito dorsal;

Abdome anteroposterior em posição ortostática.

Se o paciente não conseguir ficar em pé, fazer o raio x em decúbito lateral esquerdo.

Sinal do Empilhamento de Moedas no abdome agudo obstrutivo:

Esse é um sinal clássico do abdome agudo obstrutivo, em especial, mais alta.

Radiografia em decúbito dorsal demonstrando sinal do
empilhamento de moedas de padrão central. 

Distensão intestinal periférica no abdome agudo obstrutivo
Já nesse caso é possível identificar as haustrações, o que sugere a obstrução de intestino grosso.

Radiografia em decúbito dorsal demonstrando distensão intestinal periférica. 

Níveis hidroaéreos nas imagens radiográficas de abdome agudo obstrutivo:

Através das radiografias simples, ainda é possível identificar a divisão exata entre o líquido e o gás dentro do lúmen intestinal, devido a grande pressão interna intestinal.

Obstrução intestinal:   

Diagnóstico por Imagem no Abdome Agudo não Traumático
Sinal da dupla bolha gástrica por meio de radiografia
O sinal da dupla bolha gástrica indica uma atresia de duodeno,  importante problema causado pela falha na recanalização da obstrução dessa porção intestinal.

Conduta inicial do paciente com abdome agudo obstrutivo
É intuitivo pensar que, como a evacuação está sendo pouca ou até ausente, é importante que a primeira conduta seja o jejum.

Ainda, devido à grande perda hídrica do paciente para o 3º espaço, a hidratação deve ser providenciada com brevidade.

Em vista da grande pressão e volume fecal, é importante lembrar da dor que o paciente está sentindo. Antes de que medidas mais determinantes sejam empregadas, a analgesia é fundamental para o conforto do seu paciente.

Em seguida, deve ser passada uma sonda nasogástrica e, considerando a gravidade da obstrução, o cirurgião deve dar seu parecer e analisar a necessidade de intervenção. Por meio dela, por exemplo, é possível realizar a descompressão e reposição hidroeletrolítica.

Avaliação cirúrgica do paciente com abdome agudo obstrutivo
É na avaliação com o cirurgião que será discutido uma conduta não operatória ou cirúrgica.

Em geral, os cirurgiões estipulam 48 horas como limite para a indicação cirúrgica, apesar de não ser uma prática unânime. Por outro lado, todos os pacientes com sinais e sintomas de estrangulamento devem ser submetidos a cirurgias de emergência, já que a mortalidade aumenta muito dentre eles.

As opções para uma conduta não operatória é indicada para casos de suboclusão reversível.

Já a abordagem cirúrgica é indicada em casos de:

Complicações;
Alça fechada;
Refratária às medidas clínicas;
Obstrução mecânica irreversível.

ANATOMIA DOS INTESTINO DELGADO E GROSSO:

Os intestinos delgado e grosso fazem parte do trato gastrointestinal e são responsáveis pela digestão e absorção de macro e micronutrientes da dieta, além de contribuírem para o equilíbrio hidroeletrolítico do corpo. 

INTESTINO DELGADO:   

O intestino delgado, formado pelo duodeno, jejuno e íleo, é o principal local de absorção dos nutrientes fornecidos pela dieta oral. Se estende estende do orifício pilórico do estômago até a junção ileocecal do intestino grosso. 

O duodeno é a parte mais curta do intestino delgado com cerca de 25cm, sendo também a mais larga e fixa. Se estendendo do piloro até a flexura duodenojejunal, possui trajeto em forma de C ao redor da cabeça do pâncreas e está fixada pelo peritônio a estruturas na parede posterior do abdome, sendo considerada parcialmente retroperitoneal. 

O duodeno é dividido em quatro partes parte superior, descendente, inferior e ascendente.

DUODENO: ANATOMIA DOS INTESTINO DELGADO E GROSSO:

O jejuno compõe a segunda parte do intestino delgado e estende da flexura duodenojejunal, onde o sistema digestório volta a ser intraperitoneal. Já o íleo, termina na junção ileocecal, a união da parte terminal do íleo e o ceco. 

Juntos, o jejuno e o íleo têm 6 a 7 m de comprimento. O jejuno representa cerca de dois quintos e o íleo cerca de três quintos da parte intraperitoneal do intestino delgado. 

A maior parte do jejuno está situada no quadrante superior esquerdo (QSE) do compartimento infracólico, ao passo que a maior parte do íleo está no quadrante inferior direito (QID). A parte terminal do íleo geralmente está na pelve, de onde ascende, terminando na face medial do ceco.

JEJUNO: ANATOMIA DOS INTESTINO DELGADO E GROSSO:

Embora não haja uma linha de demarcação nítida entre o jejuno e o íleo, eles têm características distintas, que são muito importantes:

Jejuno: Coloração vermelho forte, calibre de 2 a 4 cm, parede espessa e grossa, rica vascularização, vasos retos longos, alças longas, poucos nódulos linfóides (placa de pyper). 

Íleo:  Coloração rosa pálido, calibre de 2 a 3 cm, parede fina e leve, pouca vascularização, vasos retos curtos, alças curtas, muitos nódulos linfóides (placa de pyper).

INTESTINO GROSSO:

O intestino grosso se estende por 1 a 1,5 metros desde a junção ileocecal até o ânus e é formado pelo apêndice vermiforme, colo ascendente, transverso, descendente, sigmoide, reto e canal anal. Tem importante função de absorver água dos resíduos indigeríveis do quimo líquido, contribuindo para solidificação das fezes e para que ocorra a defecação. 

Possui algumas características que a diferem do intestino delgado, como os apêndices omentais, as tênias cólicas e as haustrações. 

ANATOMIA DO INTESTINO GROSSO:

A primeira parte do intestino grosso é o ceco, uma bolsa pendente inferior à papila ileal. É completamente intraperitoneal e não tem mesentério, ficando solta na fossa ilíaca direita.

O ceco é precedido pelo íleo terminal, que se unem na junção ileocecal. A papila ileal é uma associação de válvula e esfíncter fraco, cuja abertura ativa periódica permite a entrada do conteúdo ileal e forma uma válvula unidirecional essencialmente passiva entre o íleo e o ceco, que impede o refluxo. 

O apêndice vermiforme é um divertículo intestinal, rico em tecido linfóide, de fundo cego, que tem sua origem no ceco, conectadas pelo mesoapêndice.  Na maioria das vezes, o apêndice vermiforme é retrocecal, mas em 32% dos casos desce para a pelve menor. 

O cólon se estende do ceco até o reto, dividido em ascendente, transverso, descendente e sigmóide. O cólon ascendente é uma continuação superior, secundariamente retroperitoneal do ceco, que se estende entre o nível da papila ileal e a flexura direita do colo. 

O colo transverso, suspenso pelo mesocolo transverso entre as flexuras direita e esquerda do colo, é a parte mais longa e mais móvel do intestino grosso. O nível de descida depende principalmente do biotipo.

O colo descendente ocupa posição secundariamente retroperitoneal entre a flexura esquerda do colo e a fossa ilíaca esquerda, onde é contínuo com o colo sigmoide. 

O colo sigmoide, com formato de S típico, suspenso pelo mesocolo sigmoide, tem comprimento e disposição muito variáveis, terminando na junção retossigmoidea. As tênias, saculações e apêndices omentais terminam na junção localizada nteriormente ao terceiro segmento sacral.

quarta-feira, janeiro 17

SÍNDROME FÚNGICA: SINTOMAS, FATOR DE RISCO, COMO PODE SER TRATADA?

A síndrome fúngica acontece quando há um crescimento descontrolado das colônias de fungo que ficam no intestino. Esse desequilíbrio, geralmente causado por um microrganismo conhecido, a Candida, gera problemas digestivos e em outros órgãos também.

O que é síndrome fúngica? 

Apesar de serem conhecidos como invasores e causadores de doenças, microrganismos como fungos, vírus e bactérias fazem parte da microbiota intestinal. Eles são parte essencial do bom funcionamento do intestino e do equilíbrio de outras partes do corpo.

Quando se reproduzem e crescem em uma velocidade e quantidade que não são adequadas às atividades do nosso organismo, se tornam invasores e causam doenças. É o que acontece na síndrome fúngica, cujos sintomas são desconfortos intestinais. 

Ainda não se sabe ao certo qual o limite entre a quantidade saudável de fungos no intestino e o momento em que a presença deles passa a ser prejudicial, abrindo portas para diversas infecções.

Vamos entender por que eles entram em desequilíbrio?

Muitas coisas diferentes podem aumentar a probabilidade dos fungos do intestino se desenvolverem descontroladamente. Algumas delas são:

Uso excessivo de medicamentos para úlceras e refluxos gastrointestinais 
Conhecidos como inibidores da bomba de prótons, aliviam as úlceras e reduzem a quantidade de ácido no estômago, o que aumenta as chances de contrair infecções fúngicas.

Dismotilidade intestinal: 

Acontece quando os músculos do intestino ficam prejudicados e as contrações ficam descompassadas. Essa condição pode ser genética ou consequência de doenças como diabetes, lúpus e esclerodermia.

Uso excessivo de qualquer medicamento: 

Uma vez que alguns deles têm como consequência a supressão do sistema imunológico (ou seja, que reduzem a ação dos sistemas de defesa do corpo), o que torna mais difícil para o corpo combater infecções fúngicas ou bacterianas.

Alimentação não balanceada:

Um estudo revelou que a colonização pelo fungo Candida é mais prevalente em pessoas que consomem muitos carboidratos e menos provável entre indivíduos com dietas ricas em proteínas e ácidos graxos (gorduras), desde que de boa qualidade.

Todo mundo pode ter síndrome fúngica e sintomas?

A síndrome fúngica e seus sintomas costumam atingir mais bebês e adultos já próximos à terceira idade. 

Além disso, pessoas com a imunidade debilitada - como indivíduos com HIV e outras doenças autoimunes, pessoas em tratamento de câncer, quem está tomando medicamentos antibióticos ou esteróides - também têm mais risco de desenvolver a síndrome fúngica.

Quais os fungos que causam a síndrome fúngica?

Pesquisadores chegaram à conclusão que a maior parte dos casos de síndrome fúngica é causada pelo crescimento descontrolado de um fungo bastante conhecido: a Candida. Isso porque, em um estudo, 97% dos fungos detectados em pessoas com essa condição eram dessa espécie.

A Candida é normalmente encontrada em pequenas quantidades na boca, na pele e nos intestinos. Os fungos dessa espécie fazem parte da flora intestinal, de forma que a sua presença não significa que uma pessoa tem síndrome fúngica. 

Apenas quando está em desequilíbrio e se reproduzindo descontroladamente a Candida é uma ameaça ao organismo. Nesses casos, ela causa infecções, separei alguns exemplos. 

Sapinho;
Esofagite;
Candidíase genital;
Candidemia (infecção na corrente sanguínea);
Candidíase cutânea (na pele).
Na síndrome fúngica, a Candida causa desequilíbrios no intestino que podem se espalhar por todo o sistema digestivo.

Síndrome fúngica:             sintomas: 

Os sintomas da síndrome fúngica são muito parecidos com o de outras condições que afetam o sistema digestivo. Alguns dos sinais mais comuns são:

Inchaço abdominal; 
Sensação de estar com a barriga sempre cheia;
Gases;
Arrotos;
Dores abdominais;
Diarréia;
Náuseas.

Nos casos mais graves de síndrome fúngica, sintomas podem levar a quadros de desnutrição e perda de peso.

Já quando Candida se espalha por órgãos além do sistema digestivo, causa desconfortos específicos. Nesses casos, a síndrome fúngica e sintomas podem se apresentar das seguintes formas:

Infecção vaginal - causa
inchaço;
vermelhidão, coceira e corrimento;
Infecção na pele - causa micose, coceira e até queda de cabelo;
Infecção na boca - causa
aftas
e placas esbranquiçadas nas línguas, céu da boca e bochechas.

Como saber se tenho síndrome fúngica? 

Agora que você já conhece a síndrome fúngica, sintomas e suas causas, é preciso entender como é possível descobrir que se tem essa condição e quais os tratamentos indicados.

Atualmente, a única forma de identificar e confirmar a síndrome fúngica é coletando uma amostra do líquido do intestino delgado. Isso é feito através de uma endoscopia, procedimento em que um instrumento é inserido no trato gastrointestinal, passando pelo esôfago e estômago até o intestino. 

Depois de coletar a amostra por endoscopia, ela é testada em laboratório para a confirmação da presença de fungos. Se for encontrado crescimento fúngico nessa amostra, ela é analisada para que os profissionais da saúde descubram qual a espécie do fungo responsável e qual a sua sensibilidade aos remédios drogas antifúngicos. Isso permite identificar qual o melhor medicamento para o tratamento.

O exame de fezes também pode auxiliar esse processo de diagnóstico: nele, é possível identificar a presença da Candida, mas não dá pra saber qual a sensibilidade aos medicamentos.

Como tratar?

Os medicamentos antifúngicos são a principal forma de tratamento da síndrome fúngica e seus sintomas. No entanto, eles podem não eliminar completamente os desconfortos gastrointestinais. 

Nesse momento, a alimentação balanceada é uma grande aliada do tratamento. A dieta recomendada indica comer pouco ou evitar alimentos como:

Grãos que contêm glúten:

Como trigo, centeio e cevada;
Frutas com alto teor de açúcar, como bananas, mangas e uvas;

Açúcar:

substitutos do açúcar e bebidas açucaradas;

Alguns produtos lácteos, como: 
queijo, leite e creme;
Óleos refinados
, como óleo de canola, óleo de soja e margarina;
Carnes cruas;
Cafeína;
Álcool.

Como prevenir a síndrome fúngica? 

É importante estar o tempo todo atento à síndrome fúngica e sintomas, que podem aparecer no cotidiano. A prevenção consiste em pequenos cuidados que evitam grandes complicações. Separei alguns exemplos para entendermos melhor.


Cuide bem da sua alimentação:

Evite alimentos que possuem muito glúten, como a farinha branca, e aqueles ricos em fungos, como queijos e fermentados.

Evite automedicação:

Siga apenas as orientações de um profissional de saúde para evitar o excesso de medicamentos e, consequentemente, prejudicar a imunidade.

Preze pelo sistema imunológico
Pratique atividades físicas, durma bem e mantenha uma vida balanceada, com rotina saudável, para favorecer o bom funcionamento do seu sistema imunológico.

Para ter um estilo de vida mais saudável, com alimentação balanceada e um sistema imunológico forte.

Como se tratar da síndrome fúngica?

O principal tratamento para síndrome fúngica é o uso de medicamentos antifúngicos, que devem ser indicados por um profissional da saúde. 

O que causa síndrome fúngica?

A síndrome fúngica é causada pelo crescimento desenfreado de fungos no intestino, afetando todo o trato gastrointestinal. O principal fungo responsável é a Candida, comum ao nosso organismo, mas que em desequilíbrio causa problemas.

O que não comer com síndrome fúngica?

É recomendado evitar alimentos ricos em carboidratos, como aqueles de farinha branca (pão, macarrão e outras massas), aqueles com alto teor de açúcar e alguns produtos lácteos (como queijo, leite e creme, por exemplo). Recomenda-se também evitar o álcool e a cafeína.

terça-feira, janeiro 16

QUAL A RELAÇÃO QUE EXISTE ENTRE A MICROBIOTA INTESTINAL E A OBESIDADE?

A obesidade é um problema de saúde pública significativo, responsável por mais de 60% das mortes. Sua prevalência tem aumentado rapidamente em todo o mundo, com cerca de um terço da população mundial apresentando sobrepeso e 10% com obesidade.

Estima-se que até 2030, 1,12 bilhão de pessoas serão afetadas pela condição, representando uma grande ameaça à saúde e à economia.

Sabe-se que a obesidade está relacionada a diversos fatores e o papel da microbiota intestinal em seu desenvolvimento tem sido uma área de estudo promissora.

Achados sugerem que a manipulação da microbiota intestinal pode ter o potencial de promover a perda de peso ou prevenir a obesidade em seres humanos.

microbiota intestinal e obesidade:

A obesidade é uma doença crônica, causada pelo desequilíbrio entre a ingestão e o gasto energético, resultando no acúmulo excessivo de gordura no corpo. Está associada a um maior risco de outras doenças, como problemas cardiovasculares, respiratórios, diabetes e câncer.

Sua etiologia é multifatorial e ainda não totalmente elucidada, entretanto, inclui estilo de vida sedentário, hábitos alimentares não saudáveis, predisposição genética e fatores ambientais.

qual o conceito de microbiota intestinal?

A microbiota intestinal é um complexo ecossistema de microrganismos que coloniza o trato intestinal humano, incluindo bactérias, fungos, vírus e outros organismos.

A composição da microbiota intestinal pode ser influenciada por fatores, como dieta, alimentos fermentados ou ricos em prebióticos. Em um estado saudável, a microbiota intestinal interage de forma harmoniosa com o hospedeiro, desempenhando funções importantes na digestão, absorção de nutrientes, proteção contra microrganismos prejudiciais e regulação do sistema imunológico. No entanto, quando ocorre um desequilíbrio em sua composição (disbiose), podem surgir problemas de saúde, incluindo a obesidade.

Qual a relação entre obesidade e microbiota intestinal? 

A microbiota intestinal desempenha um papel significativo no desenvolvimento e na progressão da obesidade, bem como em outros distúrbios metabólicos, como doença hepática gordurosa não alcoólica e diabetes.

A alteração da microbiota:

intestinal, supostamente, contribui para a patogênese da obesidade por meio de desequilíbrio da homeostase energética, síntese e armazenamento de lipídios, regulação do apetite e do comportamento alimentar, além de inflamação crônica de baixo grau.

A obesidade pode causar alterações na composição e na função da microbiota intestinal, e a microbiota, por sua vez, pode modular o estado nutricional.

No que diz respeito à microbiota, certas bactérias podem facilitar as vias metabólicas associadas à obesidade, além de influenciar tanto a absorção de energia da dieta quanto os genes do hospedeiro que afetam o armazenamento de energia, ou seja, ela desempenha um papel no equilíbrio energético do organismo.

Quais as principais bactérias intestinais que interferem na progressão ou prevenção da obesidade?

As bactérias intestinais desempenham um papel crítico na obesidade. Estudos em camundongos mostraram que a introdução da bactéria Enterobacter cloacae resultou em níveis reduzidos de adiponectina, concentração elevada de proteína de ligação de lipopolissacarídeo, interrupção da tolerância à glicose e ganho de peso.

Já em humanos, em grupos de indivíduos com obesidade, observa-se uma diminuição na diversidade bacteriana e um aumento na proporção Firmicutes/Bacteroidetes em comparação com indivíduos saudáveis. Certos gêneros bacterianos, como Lactobacillus, Fusobacteria e Anaerococcu, por exemplo, encontram-se em maior prevalência, enquanto outros gêneros, como Akkermansia, Bacteroides, Bifidobacterium e Clostridium, foram menos abundantes.

Algumas espécies bacterianas específicas estão associadas ao grau de obesidade e aos níveis de indicadores metabólicos, por exemplo, os gêneros Lactobacillus e Christensenellaceae foram relacionados ao índice de massa corporal (IMC) e a indicadores metabólicos, como colesterol total e triglicerídeos, respectivamente.

Estudos sugerem que além das bactérias, outros microrganismos intestinais, como archaeas intestinais, fungos e vírus, também contribuem para a patogênese da obesidade.

por quais mecanismos a microbiota intestinal influencia na obesidade?

Perda da homeostase energética: 

A microbiota alterada em indivíduos com obesidade apresenta alteração na absorção de energia dos alimentos ingeridos. Isso ocorre devido ao aumento da expressão de transportadores de nutrientes e enzimas de fermentação, resultando em maior absorção de monossacarídeos e ácidos graxos de cadeia curta (AGCCs).
Gasto de energia: A microbiota intestinal alterada em indivíduos com obesidade modifica o metabolismo de ácidos biliares e AGCCs, o que afeta o gasto energético. A redução dos ácidos biliares prejudica o gasto de energia, enquanto os AGCCs podem ter efeitos contraditórios e requerem mais pesquisas.
Síntese e armazenamento de lipídios: A microbiota intestinal alterada contribui para a síntese de lipídios por meio de múltiplos mecanismos. A redução de ácidos biliares promove a lipogênese hepática, e os AGCCs podem ser convertidos em ácidos graxos ou colesterol. Além disso, a microbiota intestinal aumenta a concentração de lipopolissacarídeos (LPS), desencadeando inflamação e resistência à insulina, o que favorece o armazenamento de lipídios.

Apetite e comportamento alimentar:                                        

A microbiota intestinal influencia o apetite e o comportamento alimentar por meio da produção de metabólitos bacterianos, hormônios intestinais e neurotransmissores. Alguns metabólitos bacterianos podem prolongar a saciedade, enquanto outros afetam a regulação do apetite no hipotálamo. Hormônios intestinais anorexígenos e neurotransmissores também desempenham um papel na regulação do apetite. Além disso, a microbiota intestinal pode afetar o humor e as vias de recompensa, influenciando assim o comportamento alimentar.
Em pacientes que realizaram cirurgia bariátrica, existe alguma modificação na microbiota intestinal?
A cirurgia bariátrica está associada a mudanças significativas na composição e função da microbiota. Essas mudanças podem desempenhar um papel importante nos efeitos da cirurgia bariátrica, como a regulação do peso corporal e a melhoria da sensibilidade à insulina.

O Guia Brasileiro de Nutrição em Cirurgia Bariátrica e Metabólica destaca que após a cirurgia, a diversidade microbiana intestinal aumenta, e diferentes tipos de cirurgia têm efeitos específicos na microbiota, por exemplo, após a cirurgia de bypass gástrico, constatou-se que houve uma diminuição de Firmicutes, Bifdobacterium spp e Bacteroidetes, e um aumento em Proteobacteria, melhorando os níveis lipídicos e de glicose no sangue.

A interação entre a microbiota intestinal e os ácidos biliares desempenha um papel na melhoria metabólica pós-cirúrgica. O uso de probióticos e prebióticos para modular a microbiota intestinal pode ser considerado, e a manutenção de hábitos alimentares saudáveis é recomendada para maximizar os benefícios da microbiota após a cirurgia bariátrica.

Conclusão:

Evidências mostram que a composição da microbiota intestinal está relacionada à obesidade, e alterar essa composição pode ser uma estratégia eficaz para alcançar uma perda de peso sustentável. Além disso, consumir alimentos como probióticos, prebióticos, alimentos fermentados, frutas e vegetais, enquanto evita alimentos ricos em gordura saturada e açúcar, pode ser uma abordagem para prevenir e tratar a obesidade.

No entanto, mais pesquisas são necessárias para entender melhor os mecanismos envolvidos nessa associação e determinar o papel exato da microbiota intestinal.

segunda-feira, janeiro 15

GASTRITE ATRÓFICA AUTOIMUNE: SINTOMAS E TRATAMENTO

“Gastrite” é um termo que ainda proporciona grande ambiguidade na medicina. Para leigos, gastrite é sinônimo de sintomas dispépticos. Para os endoscopistas, essa palavra expressa alterações macroscópicas na mucosa gástrica sem confirmação de sua origem inflamatória.

Contudo, para patologistas, microscopicamente pode haver um processo inflamatório mesmo que a gastrite não seja visível a olho nu.

Objetivamente, vamos atribuir à expressão “gastrite” a uma inflamação na mucosa gástrica, aguda ou crônica, cuja etiologia pode ser infecciosa (como a gastrite por H. pylori) e/ou autoimune.

O que é gastrite atrófica autoimune?

Gastrite Atrófica Metaplásica Autoimune (GAMA), portanto, é um termo utilizado para descrever uma forma de gastrite crônica caracterizada por um ataque imunomediado às células parietais do estômago, culminando numa substituição destas por uma mucosa atrófica e metaplásica. 

Epidemiologia:

Estima-se que essa condição afete cerca de 2 a 5% da população. Sua prevalência aumenta com a idade e, da mesma maneira que as demais doenças autoimunes, a GAMA acomete predominantemente a população feminina.

Ela comumente surge em indivíduos já portadores de doenças autoimunes como diabetes mellitus tipo 1 e tireoidite de Hashimoto. Uma vez que distúrbios na autoimunidade favorecem o desenvolvimento de outros de mesma natureza. 

Fisiopatologia da gastrite atrófica autoimune:

A etiopatogenia da GAMA é complexa e, por isso, o objetivo deste texto não é aprofundar todos os seus aspectos, mas sim construir um raciocínio que nos permita entender melhor a terapêutica dessa doença. 

Nesse sentido, o aspecto principal de sua fisiopatologia é a ação de anticorpos contra as células parietais do estômago, comumente localizadas no corpo e fundo do estomacal.

Essas células são responsáveis pela secreção de: a ) ácido gástrico, responsável pela prevenção da colonização do estômago por bactérias e pela conversão de pepsinogênio em pepsina, enzima que auxilia na digestão proteica, b ) fator intrínseco, necessário para a absorção da cobalamina (vitamina B12). 

A destruição dessas células ocorre às custas da ação de anticorpos contra a H+, K+– ATPase, bomba essencial para a secreção do ácido estomacal. Esse fenômeno pode ser deflagrado, inclusive, pela infecção vigente pela H. pylori, cujos antígenos apresentam mimetismo molecular com essa bomba – ou seja, a produção de anticorpos contra a bactéria pode causar uma agressão às células parietais do próprio organismo. A destruição das células parietais, portanto, repercute da seguinte maneira:

Hipergastrinemia:

Como a produção e secreção do ácido gástrico está prejudicada, ocorre um feedback positivo para a produção de gastrina pelas células G estomacais, hormônio estimulador da secreção ácida. Tendo em vista que uma das maneiras de estimular essa secreção é através do estímulo a células semelhantes a enterocromafins (ECL) – responsáveis pela produção de histamina, hormônio intensificador dos efeitos da gastrina nas células parietais. No contexto da GAMA, a hipergastrinemia crônica leva a uma hiperplasia das ECL. 

Deficiência de vitamina B12:

Conforme vimos anteriormente  lá em cima, o fator intrínseco é importante para a absorção de vitamina B12 no íleo terminal. Com a destruição de células parietais, não há produção do fator intrínseco e, logo, instala-se uma deficiência de B12. Como essa vitamina participa da produção de hemácias, sua carência leva a uma anemia perniciosa, um subtipo de anemia megaloblástica.

Deficiência de ferro:

Fisiologicamente, a acidez gástrica cria um mecanismo que converte a forma férrica do ferro (Fe3+) em sua forma ferrosa (Fe2+), que é mais facilmente absorvida. Como a destruição das células parietais leva a uma menor secreção do ácido gástrico (HCl), a absorção do ferro é prejudicada. Instala-se, assim, uma anemia ferropriva, uma vez que o ferro é também uma substância importante para a produção de hemácias. 

Outro aspecto secundário, mas também importante, é que, na GAMA, também ocorre perda de células principais, responsáveis pela produção de pepsinogênio. Dessa forma, pode haver uma redução dos níveis séricos de pepsinogênio I, que é relevante para fins de diagnóstico.


A destruição das células parietais reduz a acidez estomacal, estimulando a hipergastrinemia.
Quadro clínico da gastrite atrófica autoimune
Os pacientes com GAMA são majoritariamente assintomáticos do ponto de vista gastrointestinal e, quando sintomáticos, podem apresentar dispepsia e plenitude pós-prandial. A síndrome anêmica gerada pela deficiência de ferro e vitamina B12 é, nessa doença, a principal responsável por suas manifestações clínicas. 

Anemia ferropriva:

Predomina nas fases iniciais da doença, tendo como principais sintomas a fadiga, palidez, tontura e dispneia. Em estágios avançados, pode haver coiloníquia (unha côncava), queilose (lesões em ângulos da boca), glossite e picafagia (desejo anormal de ingerir material não alimentar).

manifesta no hemograma como uma anemia microcítica e hipocrômica.

Anemia perniciosa:

Predomina nas fases mais tardias da doença, desencadeando sintomas como fadiga, irritabilidade, declínio cognitivo e glossite.

Pode desencadear ainda uma neuropatia por deficiência de B12 (beribéri seco), que se manifesta principalmente através da diminuição simétrica da sensibilidade vibratória e proprioceptiva, fraqueza em membros inferiores e ataxia sensitiva.

Laboratorialmente, manifesta-se através de anemia macrocítica e normocrômica. 

Gastrite atrófica autoimune: complicações:

Então, partindo do pressuposto que está havendo uma proliferação anormal dessas células, faz sentido pensar que há um risco aumentado para o crescimento de tumores.

Com a contribuição ou não de fatores genéticos, essa hiperplasia pode levar ao desenvolvimento de tumores neuroendócrinos gástricos (carcinoides). Na endoscopia, esses tumores aparecem como múltiplos nódulos ou pólipos pequenos (< 1 cm).

Além disso, a inflamação crônica inerente à GAMA provoca atrofia das glândulas gástricas e, eventualmente, metaplasia intestinal da mucosa gástrica.

Essas alterações, somadas à anemia perniciosa e a idades avançadas, representam fatores de risco para o desenvolvimento do câncer adenocarcinoma gástrico.

Diagnóstico gastrite atrófica autoimune: 

O diagnóstico padrão-ouro da gastrite atrófica autoimune é feito através da avaliação histológica de biópsias gástricas coletadas via Endoscopia Digestiva Alta (EDA). 

Em estágios iniciais da doença, a aparência da mucosa gástrica na EDA é normal. Contudo, com a progressão, ela passa a se manifestar através de atrofia do corpo e fundo gástrico, tornando as pregas gástricas delgadas e os vasos submucosos visíveis, com preservação relativa do antro.

A mucosa, nesse estágio, pode ter aspecto pseudopolipoide, uma vez que se observam áreas polipoides de mucosa oxíntica preservada em meio a áreas atrofiadas.

Biópsia: 

A biópsia deve ser coletada em pelo menos dois sítios topográficos da mucosa gástrica ou seja, deve ser coletada na maior e na menor curvaturas do antro e corpo gástrico.

Além disso, é interessante incluir a incisura angular nessa coleta e, caso necessário, pode-se realizar biópsias adicionais de lesões de aparência suspeita.

Histopatologia:

Na histopatologia, a GAMA apresenta um infiltrado inflamatório composto predominantemente por linfócitos, macrófagos e plasmócitos.

Em estágios mais avançados, pode haver inflamação crônica com perda extensa de células parietais e principais, bem como processos de metaplasia pseudopilórica e/ou intestinal.

A metaplasia intestinal é uma característica universal da gastrite atrófica crônica e reflete, em linhas gerais, uma adaptação celular provocada pelo aumento do pH gástrico e/ou atividade bacteriana.

Pacientes com GAMA podem ainda apresentar o seguinte perfil laboratorial: 

a) hipergastrinemia em jejum;
b) redução da razão entre pepsinogênio I e II, uma vez que apenas o primeiro encontra-se reduzido;
c) anemia ferropriva: microcítica, hipocrômica, com redução dos níveis séricos de ferro e ferritina;
d) anemia megaloblástica: macrocítica, com aumento de ácido metilmalônico, pancitopenia e neutrófilos hipersegmentados.
Por fim, testes sorológicos podem ser utilizados como métodos complementares ao diagnóstico histológico de GAMA.

Dentre eles, encontram-se as dosagens de anticorpos para o fator intrínseco e de anticorpos contra células parietais. 

Tratamento gastrite atrófica autoimune:

Em geral, por ser majoritariamente assintomática, a gastrite atrófica autoimune não requer tratamento na maioria dos pacientes. Mesmo para pacientes sintomáticos, não existe tratamento específico, e sim de suporte, visando eliminar potenciais agentes agressores ou combater a síndrome anêmica instalada.

Um dos principais agentes agressores, conforme explicado no tópico “Fisiopatologia”, é a bactéria H. pylori. Caso identificada na biópsia, devemos buscar eliminá-la o mais rápido possível, uma vez que sua eliminação pode levar à regressão parcial gastrite atrófica.

Investigação e terapia de reposição:

É importante salientar que a presença de anemia ferropriva exige a investigação cuidadosa de possíveis neoplasias de estômago ou cólon, além da terapia de reposição.

Da mesma maneira, um quadro de anemia perniciosa, no contexto da GAMA, requer realização de EDA para investigar possíveis complicações como os tumores carcinoides e adenocarcinoma gástrico.

Vigilância endoscópia:

É interessante que pacientes portadores de gastrite atrófica avançada sejam submetidos a vigilância endoscópica periodicamente.

Embora ainda não haja um consenso na literatura, atualmente recomenda-se que portadores de GAMA avançada com histórico familiar de câncer gástrico realizem EDA a cada 1 ou 2 anos e, na ausência de histórico familiar, a cada 3 anos.

Ainda não há evidências de que portadores de doença leve a moderada se beneficiam de vigilância endoscópica.

domingo, janeiro 14

HELICOBACTER PYLORI: QUAIS SÃO OS PRINCIPAIS FATORES DE RISCO?

Em 1982,  Marshall e Warren identificaram e cultivaram a bactéria gástrica Campylobacter pyloridis. Mais tarde foi reclassificada como Helicobacter pylori ( H. pylori ), o que desencadeou profundas alterações em muitos princípios básicos da gastroenterologia.

Essas alterações foram importantes pela relação entre a inflamação persistente na mucosa gástrica causada pela bactéria com diferentes lesões orgânicas em humanos, tais como gastrite crônica, úlcera péptica e câncer gástrico.   

Patogênese:

A H. pylori  é uma bactéria gram negativa,  de forma curva ou espiralar. Sua extensão varia de 0,5 a 1µm de largura e 2,5 a 5µm de comprimento. O organismo possui de dois a sete flagelos revestidos unipolares que aumentam sua mobilidade por meio de soluções viscosas.

O seu formato em hélice espiralada, de onde vem o nome “Helicobacter”, permite que ela atravesse com facilidade a camada de muco que protege o epitélio gástrico. 

A H. pylori possui a capacidade de sobreviver em ambientes altamente ácidos do estômago, graças à sua habilidade de excretar amônia, que ajuda a neutralizar a acidez. A bactéria produz a enzima urease, que converte a uréia em amônia e CO2, fornecendo a proteção necessária para a sua sobrevivência.

A sua adesão ao muco e as células epiteliais dá-se pela produção de adesinas. A produção da amônia e a liberação, com a consequente ação de proteases, catalases e fosfolipases da H. pylori são responsáveis pela ação agressora às células epiteliais gástricas e utilizadas para a caracterização laboratorial, pois estas bactérias são positivas para teste de oxidase e catalase.

As cepas existentes da H. pylori:

Cepas que possuem a cag PAI são chamadas de linhagens cagA-positivas e induzem alta titulação de anticorpos anti-proteína CagA.

Pacientes infectados por esta cepa desencadeiam uma maior resposta inflamatória. Além disso, possuem maior risco de desenvolver um quadro sintomático, seja úlcera ou gastrite atrófica. 

As cepas de CagA estão associadas a uma maior frequência de lesões pré-cancerosas e câncer gástrico. 

A proteína VacA, ou “citotoxina vacuolizadora”, é um fator de virulência com papel crucial na patogênese da H. pylori. Tem três atividades celulares confirmadas:

Vacuolização celular:

Apoptose:

Ativação dos linfócitos T CD4 positivos e proliferação.
Epidemiologia da H. pylori 
A gastrite induzida pelo H. pylori é uma das infecções crônicas mais comuns na espécie humana. Compromete cerca de metade da população mundial. Ela ocorre em todo o mundo e em indivíduos de todas as idades.

A bactéria apresenta distribuição cosmopolita, sendo encontrada em habitantes dos cinco continentes. No entanto, a infecção é mais frequente e adquirida mais cedo nos países em desenvolvimento em comparação com as nações industrializadas.

A prevalência da infecção por H. pylori:

Sabe-se que a prevalência da infecção pelo H. pylori varia com a idade, o nível socioeconômico e a raça. A evidência sorológica raramente é encontrada antes dos 10 anos. Porém, aumenta para 10 por cento naqueles entre 18 e 30 anos de idade e para 50 por cento naqueles com mais de 60 anos.

Em qualquer faixa etária, a infecção parece ser mais comum em negros e hispânicos em comparação com a população branca. Essas diferenças provavelmente estão em parte relacionadas a fatores socioeconômicos.

Quadro Clínico da H. pylori:

O quadro clínico da infecção por H. pylori pode variar de assintomático a sintomas graves. Nesse último, o paciente pode cursar com como dor abdominal, náusea, vômito e perda de peso.

A infecção também é um importante fator de risco para o desenvolvimento de úlceras gástricas e duodenais, bem como de câncer gástrico e linfoma.

Gastrite:

Após a infecção primária, a gastrite é uma consequência presente em quase todos os indivíduos infectados, apesar de muitos hospedeiros permanecerem assintomáticos.

No entanto, cerca de 50% poderão apresentar sintomas de gastrite aguda, tais como náuseas, vômitos, digestão difícil e demorada. A persistência pode causar sérios danos à mucosa gástrica, podendo evoluir para gastrite atrófica, atrofia gástrica e metaplasia. 

Úlcera:

Apesar de apenas 10 a 15 % dos pacientes com infecção por H. pylori desenvolverem úlcera, existem várias evidências que implicam a bactéria como um fator etiológico principal nas úlceras duodenais.

O mecanismo preciso pelo qual o H. pylori contribui para a formação de DU não é completamente compreendido. No entanto, a bactéria parece aumentar a secreção de ácido gástrico, contribui para a metaplasia gástrica e afeta os mecanismos de defesa da mucosa gástrica. 

Cânceres gástricos:

A infecção por H. pylori  é responsável por 30 a 50% de todos os cânceres gástricos, principalmente em países desenvolvidos. Isso é responsável por quase 350.000 cânceres gástricos anualmente em todo o mundo.

Raramente ocorre abaixo dos 40 anos e as crianças, mesmo não desenvolvendo câncer gástrico, mas quando são infectados por H. pylori na infância pode levar a um aumento da prevalência da atrofia gástrica, que aumentaria o risco de desenvolver, posteriormente, adenocarcinoma gástrico. 

Um estômago normal não contém folículos linfóides, no entanto, em pacientes com gastrite crônica ativa associada com H. pylori, encontra-se intenso infiltrado linfóide levando a hipótese de que a indução da gastrite por H. pylori poderia ser o precursor de linfomas, principalmente o linfoma MALT (Linfoma do tecido linfóide associado à mucosa).

Diagnóstico da H. pylori
O diagnóstico pode ser feito em pacientes com quadro clínico compatível através de testes não invasivos como:

Cultura:

Teste rápido da urease;
Reação em cadeia da polimerase (PCR).
Todos necessitam da coleta de biópsia gástrica, obtida através da endoscopia digestiva, um método invasivo não recomendável em populações pediátricas.

Os testes sorológicos mais utilizados em estudos epidemiológicos e em caso de indivíduos assintomáticos, identificando anticorpos específicos à infecção por H. pylori na secreção gástrica, urina, saliva e outros fluidos. Entretanto, os métodos sorológicos não tem papel na identificação e acompanhamento de atividade da infecção. 

Tratamento da H. pylori:

Todos os pacientes com evidência de infecção ativa por H. pylori devem receber tratamento. A escolha do esquema inicial de antibióticos para tratar H. pylori deve ser orientada pela presença de fatores de risco para resistência a macrolídeos e pela presença de alergia à penicilina.  

O tratamento clínico padrão para a infecção pela H. pylori combina o uso de dois antibióticos com um inibidor de bomba de prótons (IBP), Omeprazol, Lanzoprazol ou Pantoprazol.

O estudo da patologia: 

gastrointestinal é fundamental para o entendimento das doenças que afetam o sistema digestório, como a infecção por H. pylori, úlceras gástricas e duodenais, doença do refluxo gastroesofágico, entre outras. 

O QUE É O METABOLISMO DO FERRO?